É outubro e, além de pensar nas provas e no final do semestre de suas nove turmas, Marisa*, 29, prepara-se para as provas de dois concursos públicos municipais. Professora temporária de língua portuguesa em duas escolas da rede estadual de Santa Catarina, seu contrato termina em dezembro. Depois disso, seguem-se meses de incerteza e sem salário. Luísa*, 35, designada em uma escola de ensino médio de Minas Gerais ainda busca nos editais do estado mais alguma vaga para preencher seus horários antes do final do ano. Ela dá aulas para cinco turmas em uma escola, são sete horas-aula semanais que não lhe garantem um salário mínimo completo por mês.
Temporário, designado, contratado. O nome muda e os termos
do contrato também, mas o cenário é bastante parecido para os mais de 560 mil
professores da rede pública em todo o país que vivem com contratos temporários
de trabalho. Só nas escolas estaduais, são 276 mil ou 40% dos professores
dessas redes, de acordo com o Censo Escolar 2018.
A média de temporários nos Estados, responsáveis pela
oferta de matrículas do sexto ano do ensino fundamental ao final do ensino
médio, é maior que entre as redes municipais, que tinham 25,5% de seus
professores nesse tipo de contrato no ano passado.
Os dados publicados este ano pelo MEC (Ministério da
Educação) mostram que 11 Estados têm mais da metade de seus docentes em
contrato temporário.
São profissionais que passam por uma seleção da rede
estadual para terem o direito de serem chamados para assumir salas de aula ao
longo do ano letivo ?seja para cobrir o tempo de uma licença médica, seja para
ficar no lugar de um colega que se aposentou.
O tempo de trabalho em cada contrato pode variar de poucas
semanas ao ano letivo completo, e eles só recebem enquanto estão na sala de
aula. A única certeza é que entre o final de dezembro e o início do próximo ano
escolar não terão ocupação e, portanto, rendimentos.
As redes estaduais consideram o contrato temporário
indispensável ao bom funcionamento do sistema de ensino. "O número de
alunos matriculados nas redes está sofrendo uma redução progressiva na média de
2% ao ano. Dessa forma, os sistemas públicos não têm como compor um quadro só
de professores efetivos", argumenta o Consed (Conselho Nacional de
Secretários de Educação).
"A situação fragmenta o projeto político-pedagógico e,
de certa forma, compromete a qualidade de ensino, tendo em vista a rotatividade
dos docentes entre as diversas unidades escolares", avalia um parecer do
Conselho Nacional de Educação de 2009.
Já especialistas em educação criticam o uso excessivo do
regime temporário que fragiliza a condição do professor, que remuneração
instável, e aumenta a rotatividade de profissionais na escola, reduzindo a
criação de vínculo com alunos e comunidade.
O Plano Nacional de Educação, aprovado em 2014, tinha como
meta que as redes tivessem até 2017 apenas 10% de seu corpo docente como
temporário. Mas, em 2018, apenas quatro redes estaduais atendiam esse objetivo:
Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Sergipe e Rondônia.
A alta rotatividade dos professores é um complicador para a
qualidade de educação ofertada na unidade, afirmam especialistas. Um professor
que fica pouco tempo na escola tem menos condições de conhecer seus alunos e a
comunidade e assim planejar atividades mais específicas para aquele grupo e
fazer planos que possam ter continuidade ao longo da formação dos alunos.
"As pesquisas internacionais apontam que a permanência
do professor no local de trabalho é fundamental para a qualidade de ensino. Uma
escola que mantém um corpo docente mais estável tem um coletivo mais integrado
para planejar, para trocar informações sobre os alunos", diz Dalila Andrade
Oliveira, pesquisadora da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
A Secretaria de Educação de Santa Catarina diz ter ciência dos prejuízos que a alta rotatividade pode causar "ao processo de ensino-aprendizagem e à comunidade escolar" e fazer um esforço significativo para que o professor efetivo permaneça na mesma unidade.
Fonte: Consed
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