Foto reprodução internet
Da Redação
Prof. Taciano Medrado
Dois dias após o assassinato do general iraniano Qasem Soleimani em
um ataque ordenado pelos Estados Unidos em Bagdá, os Governos de Irã e Iraque
iniciaram medidas de represália. O Irã anunciou
neste domingo que deixará de respeitar seus compromissos sob o acordo nuclear de 2015. Já o parlamento do Iraque aprovou
uma moção exigindo que o Governo expulse as tropas norte-americanas.
De acordo com a televisão estatal, Teerã afirmou que não limitará mais o número de centrífugas de enriquecimento de urânio que utiliza. O Irã agora baseará o nível de enriquecimento nas necessidades técnicas do país, embora mantenha a cooperação com a agência nuclear da ONU. O porta-voz citado na televisão apontou que esses próximos passos podem ser revertidos se Washington suspender as sanções que mantém sobre o país. O regime iraniano vinha se afastando do acordo desde que os Estados Unidos o abandonaram em 2018.
Em meio à troca de ameaças entre Washington e Teerã, parlamentares do Iraque aprovaram a moção exigindo a expulsão das tropas norte-americanas. O próprio primeiro-ministro interino, Adil Abdul-Mahdi, defendeu essa opção como “a melhor para o Iraque”. A sessão no Parlamento, onde o bloco xiita tem maioria, transcorreu em um ambiente tenso (os parlamentares dos blocos sunita e curdo não participaram da sessão) e também no contexto de confrontos entre as milícias iraquianas pró-iranianas e manifestantes de sinal oposto e às homenagens que milhares de iranianos prestavam a Soleimani, cujo corpo foi repatriado neste domingo. A votação defende que a saída das tropas é “o melhor para o Iraque”, mas se trata de uma resolução não vinculante e o Executivo iraquiano deve negociar com Washington a modificação ou a rescisão do atual acordo que têm.
Em sua intervenção no
plenário, o primeiro-ministro iraquiano em exercício explicou que seu país tem
duas opções sobre a mesa: uma é exigir a retirada completa das tropas
estrangeiras e a outra é renegociar o acordo que rege sua presença. Abdul-Mahdi
se mostrou a favor da primeira opção: “Apesar das dificuldades externas e
internas que podemos enfrentar, é o melhor para o Iraque”. Ao mesmo tempo, o
Ministério das Relações Exteriores iraquiano apresentou uma queixa ao Conselho de Segurança das Nações Unidas pelo
ataque dos EUA que acabou com a vida de Soleimani, do comandante das milícias
xiitas iraquianas Forças de Mobilização Popular (FMP), Abu Mahdi al-Muhandis, e
outros oito militares de ambos os países. A diplomacia iraquiana exige que o
órgão da ONU condene o ataque por representar uma “perigosa violação da
soberania do Iraque e das regras da presença dos EUA” no país.
A mobilização de mais de 5.000 militares norte-americanos no Iraque se baseia em um acordo assinado pelos Governos de ambos os países depois que Bagdá convidou a Coalizão Internacional liderada pelos EUA a mobilizar suas tropas em 2014 para combater o grupo jihadista Estado Islâmico (EI). O Governo iraquiano opera interinamente depois que o primeiro-ministro pediu demissão em novembro para acalmar os manifestantes que protestam nas ruas há meses contra a corrupção e a falta de empregos e serviços. Abdul-Mahdi continua no cargo de maneira temporária até o fragmentado Parlamento iraquiano entrar em acordo com relação ao sucessor, algo que o primeiro-ministro pediu em sua intervenção parlamentar.
De acordo com a imprensa local, 170 deputados do bloco xiita —dos 329 do Parlamento do Iraque— assinaram a proposta votada em plenário pedindo a saída das tropas estrangeiras, incluindo a revisão da mobilização de instrutores de outros países ocidentais. “O Governo se compromete a revogar seu pedido de assistência à coalizão de luta contra o Estado Islâmico devido ao fim das operações no Iraque e à conquista da vitória. O Governo iraquiano deve trabalhar para acabar com a presença de todo tipo de tropas estrangeiras em solo iraquiano, proibi-las de usar seu território, seu espaço aéreo e suas águas territoriais por qualquer razão”, diz a moção aprovada, segundo a agência Reuters.
Os parlamentares dos blocos sunita e curdo não participaram da sessão em protesto contra a crescente influência iraniana; portanto, a falta de quórum levou ao adiamento da votação por algumas horas. “Nesta questão preferimos adotar uma postura neutra que seja do interesse do Iraque e da região do Curdistão”, explicou Vian Sabri, presidenta do grupo parlamentar do partido curdo KDP, em declarações ao canal Kurdistan 24.
A promotora da moção é a coalizão Fatah —o grupo mais pró-iraniano do Parlamento iraquiano e ao qual as FMP estão vinculadas—, que justifica a exigência da retirada dos EUA pelo fato de já terem cumprido sua missão de derrotar o EI e suas últimas ações no Iraque serem uma violação da soberania nacional. No sábado, o líder do Fatah, Hadi al-Amiri, jurou diante do caixão de Muhandis: “O preço do seu sangue será a saída das tropas norte-americanas do Iraque”. Outro deputado do mesmo grupo, Ahmad al-Kinany, advertiu no Twitter que os deputados ausentes do plenário serão considerados “traidores da pátria”. Fontes militares dos EUA reconheceram à agência France Presse que acompanham o debate parlamentar com “apreensão” e “nervosismo”.
A tensão provocada pelo assassinato de Soleimani é
sentida em todo o Iraque. Em Nasiriyah (sudeste), ocorreram confrontos quando
um enterro simbólico realizado por grupos pró-iranianos tentou penetrar em um
acampamento de manifestantes por motivos sociais, parte dos protestos que
atormentaram o Iraque nos últimos meses, criticando a corrupção e a excessiva
influência iraniana. Um miliciano das FMP abriu fogo contra os outros
manifestantes ferindo quatro pessoas, informou a agência EFE citando fontes
policiais.
A brigada xiita Kataeb Hezbollah (KH), uma das mais radicais das FMP, pediu voluntários “para o martírio” em ações contra os EUA e deu um ultimato até as cinco da tarde de domingo (11 da manhã em Brasília) para que as forças de segurança iraquianas “se afastem pelo menos 1.000 metros das bases norte-americanas”. Já na tarde de sábado vários foguetes atingiram o bairro de Bagdá onde está localizada a Embaixada dos Estados Unidos e uma base militar norte-americana um pouco mais ao norte, embora sem causar mortes e sem que nenhum grupo reivindicasse a ação. O secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, criticou duramente essa ameaça e chamou a KH de “pistoleiros”.
Fonte : El Pais
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