Na Rússia, contestar as ações do
presidente Vladimir
Putin ou protestar contra a guerra na Ucrânia é uma missão
desafiadora, devido à repressão estatal que leva dissidentes à prisão diariamente.
A situação ficou ainda mais tensa durante o conflito, com o aumento dos casos
de civis partidários de Putin que passaram a denunciar os manifestantes
antiguerra e os opositores do regime em geral. As informações são da rede Radio Free Europe.
A
professora de inglês Irina Gen, da cidade de Penza, foi uma das vítimas desse
sistema de denúncias populares que muitos no país comparam aos tempos de Stalin
e aos piores dias da União Soviética. Ela foi processada criminalmente
porque debateu
a guerra na Ucrânia com alunos do ensino médio. Ocorre que um dos
estudantes filmou o debate e o tornou público, atraindo a atenção do Estado.
Particularmente,
o que levou Gen a ser acusada foi citar o bombardeio de uma maternidade
na cidade de Mariupol, um episódio que poderia configurar crime de guerra e
que as autoridades russas alegam ser falso. O caso dela foi inserido em uma lei
de março deste ano que criminaliza a distribuição do que o governo vier a
considerar “notícias
falsas” sobre operações militares russas.
De
acordo com o texto legal, é proibido publicar conteúdo “contra o uso de tropas
russas para proteger os interesses da Rússia” ou “para desacreditar tal uso”.
As únicas fontes de informação válidas seriam as do próprio governo, e quem vier
a divulgar conteúdo de outros veículos corre o risco de punição. Casos que
venham a gerar “consequências graves” podem levar a uma sentença de 15 anos de
prisão.
Gen,
que pediu demissão após a denúncia contra ela, diz que seu caso não foi
fortuito. “Eu acho que tudo isso se originou com os pais [dos alunos]. Ou seja,
uma criança em uma conversa mencionou que a professora de inglês tinha um ponto
de vista completamente diferente”, disse ela. “Sei que um pai de aluno dessa
turma trabalha para a FSB (Agência Federal de Segurança). Acho que foram
enviados para me gravar e ‘vazar’ para a polícia”.
Além
de punir os opositores, o governo tem estimulado seus aliados a denunciarem
casos que possam configurar ilegalidade. Em discurso aos ministros do governo,
no dia 16 de março, o próprio Putin pediu uma “autolimpeza natural e necessária
da sociedade” e disse que os russos “sempre serão capazes de distinguir
patriotas de escória
e traidores e cuspi-los como uma mosca que acidentalmente voou em suas
bocas”.
A
professora de matemática Yelena Baibekova, da cidade de Astrakhan, foi vítima
de uma denúncia semelhante à que tirou o emprego da colega. A direção da escola
cita reclamações feitas por alunos de que vinham ocorrendo debates políticos em
sala de aula.
A
versão de Baibekova é diferente. Ela admite que participou de protestos
antiguerra quando estava de folga, mas diz que jamais debateu política em sala
de aula. E alega que a demissão foi orquestrada por colegas que já vinham
pedindo a demissão dela por seu posicionamento político.
“As
acusações contra mim são completamente inventadas. Eu disse à diretora da
escola que agora sei como eram as pessoas que fizeram denúncias em 1937”, disse
a professora, referindo-se ao auge do Grande Terror de Stalin, quando milhões
de soviéticos foram presos pelo Estado denunciados por outros civis. “Já ela (a
diretora) respondeu que agora sabe como são os fascistas e os traidores da
pátria”.
Andrei
Shestakov já viveu essa situação duas vezes. Quando trabalhava como oficial de
polícia, foi demitido por apoiar o oposicionista Alexei Navalny, principal
adversário doméstico de Putin e atualmente preso em função de acusações
que diz serem forjadas. Ultimamente, vinha atuando como professor de
história quando perdeu o emprego após uma denúncia de pais de alunos por
debater temas como democracia e as eleições na Ucrânia.
Na
Rússia de Putin, mesmo uma simples conversa em um ambiente público pode gerar
denúncia popular. Ocorreu com Oksana e Aleksandr Veselov, que estavam em uma
cafeteria da cidade de Nalchik falando sobre um conhecido que havia morrido na
guerra. O casal foi denunciado por quatro senhoras que ouviram o papo. Dois
agentes de segurança se negaram a autuá-los, mas um terceiro policial fez o
registro. Receberam uma multa de 30 mil rublos (R$ 1,66 mil) por dizerem que a
invasão da Ucrânia é ilegal.
No
caso de Naberezhnye Chelny, a multa de 30 mil rublos foi aplicada porque um
vizinho denunciou a presença de um bandeira com o texto “não à guerra” na
sacada dela. Já Konstantin Trudnik, um ativista da cidade de Krasnodar, decidiu
fugir da repressão e deixou a Rússia depois que um “amigo próximo”, nas
palavras dele, o denunciou por ser contra Putin.
Os
mortos de Putin
Desde
que assumiu o poder na Rússia, em 1999, o presidente Vladimir Putin esteve
envolvido, direta ou indiretamente, ou é forte suspeito de ter relação com
inúmeros eventos, que levaram a dezenas de milhares de mortes. A lista de
vítimas do líder russo tem soldados, civis, dissidentes e até crianças. E vai
aumentar bastante com a guerra que ele provocou na Ucrânia
Na
conta dos mortos de Putin entram a guerra devastadora na região do Cáucaso,
ações fatais de suas forças especiais que resultaram em baixas civis até dentro
do território russo, a queda suspeita de um avião comercial e, em 2022, a
invasão à Ucrânia que
colocou o mundo em alerta.
Fonte: A Referência
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