Por: Tábata Viapiana, repórter da revista Consultor Jurídico
A
presunção de hipossuficiência da mulher, implicando a necessidade de o
Estado oferecer proteção especial para reequilibrar a desproporcionalidade,
constitui-se em pressuposto de validade da Lei Maria da Penha.
Com
base nesse entendimento, a 15ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de
Justiça de São Paulo confirmou a condenação de um homem por maus tratos contra
a filha de 12 anos. A pena é de três meses e três dias de detenção, em regime
inicial aberto, concedida a suspensão pelo prazo de dois anos.
De
acordo com os autos, o réu tinha a guarda da filha havia sete anos. Um dia,
após suspeitar que a menina possuía um perfil secreto no Instagram para se
comunicar com a mãe, o acusado acabou agredindo a filha com um cinto. Ela
sofreu lesões na perna esquerda, comprovadas por perícia médica.
Em
juízo, o pai disse que sua intenção era de bater com o cinto no chão, para
"repreender" a filha por supostamente manter o perfil secreto. Porém,
segundo o réu, ao bater com o cinto no chão, acabou atingindo a perna da filha.
Ele disse que logo se arrependeu e se desculpou pelo ocorrido. A menina
confirmou as agressões em juízo e disse que o pai a atingiu várias vezes com o
cinto.
De
início, o relator, desembargador Willian Campos, rejeitou o pedido do réu para
afastar a aplicação dos preceitos da Lei Maria da Penha. "Isso
porque bem caracterizada a violência de gênero exigida pela Lei Maria da
Penha, uma vez que a vítima foi agredida por seu genitor no âmbito
familiar", afirmou.
Segundo
o magistrado, a vítima estava sob a guarda judicial do réu e ambos viviam sob o
mesmo teto, sendo incontestável o vínculo entre a conduta criminosa e a relação
familiar. E, ainda que assim não fosse, Campos disse que os elementos de prova
colhidos revelam a vulnerabilidade da vítima.
"Os
maus tratos perpetrados pelo réu estão comprovados pela confissão judicial do
réu, pelas declarações da vítima e testemunhas, corroboradas pelo boletim de
ocorrência, pelas fotografias e pelo laudo pericial, que constatou a presença
de equimoses amarelo e esverdeadas em toda a face lateral do membro inferior
esquerdo da vítima, compatíveis com histórico de agressão com cinta, concluindo
pela existência de lesões corporais de natureza leve", disse Campos.
O
relator também destacou que, em crimes cometidos no âmbito doméstico e
familiar, a palavra da vítima possui especial relevância, pois os delitos
costumam ser cometidos longe de testemunhas, aproveitando-se o agressor do
vínculo que mantém com a vítima.
"A
alegação da defesa de ausência de dolo, pois as 'cintadas' teriam sido
direcionadas ao chão, não deve prosperar. As lesões constatadas na vítima
demonstram claramente que as investidas não foram acidentais. À evidência que o
réu, ao agredir violentamente a adolescente com golpes de cinta, embora com
animus corrigendi, extrapolou os meios necessários para tanto, colocando em
risco a integridade física da infante, tanto que lhe provocou ferimentos",
concluiu. A decisão foi unânime.
Processo 1504114-98.2019.8.26.0564
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