(*) Ana Viriato /Revista Isto É
O
Mensalão estampou a facilidade com a qual congressistas colocaram-se à venda. A
Lava Jato descortinou o maior escândalo de corrupção do país e demonstrou a
transformação dos órgãos públicos em um balcão de negócios escusos. Operações
policiais nos estados expuseram governadores que drenaram os cofres para encher
os próprios bolsos enquanto a população padecia com serviços sucateados e
inoperantes. Não à toa, após décadas de um país tragado pela imoralidade, a
prisão ou a condenação à inelegibilidade de boa parte dos políticos poderosos
envolvidos nos esquemas aparentavam, finalmente, ter colocado um ponto final na
impunidade. Ilusão. Com uma mãozinha do Judiciário e outra do Congresso, nomes
influentes — e enrolados — se reabilitaram e pavimentam o caminho para voltar à
cena nas eleições ou articulam nos bastidores para emplacar aliados.
A
corrida presidencial é a prova de que os políticos brasileiros não ficam por
muito no deserto. Lula poderá testar as urnas graças à decisão em que o STF
reconheceu a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgá-lo,
anulou as condenações dele na Lava Jato e remeteu os processos à Justiça
Federal do DF para uma nova análise — àquela altura os crimes estavam
prescritos. Valdemar Costa Neto, condenado no Mensalão e manda-chuva do PL,
está entre os nomes que dão as cartas na campanha de Bolsonaro e, com a
filiação do capitão, transformou seu partido no maior do Brasil, o que lhe
garante gordos repasses de dinheiro público. Embora os dois sejam os exemplos
mais cristalinos de políticos que “deram a volta por cima”, a lista vai muito
além.
Eduardo
Cunha (PTB-SP) retomou os direitos políticos no TRF da 1ª Região. O
ex-deputado, em princípio, estava inelegível até 2027 por mentir sobre a
existência de contas em seu nome no exterior, mas o desembargador Carlos
Augusto Pires Brandão anulou, em decisão liminar, a resolução da Câmara de 2016
que impôs a cassação do mandato dele e, assim, o livrou da Lei da Ficha Limpa.
Cunha, agora, quer surfar na onda de extrema-direita para se eleger. A
convenção que o confirmará como candidato está prevista para sábado (30) e
contará com a presença de Bolsonaro. Pivô do impeachment de Dilma Rousseff, o
ex-parlamentar montou um roteiro de viagens pelo estado paulista para promover
o livro Tchau, Querida, na tentativa de faturar com o antipetismo.
Outros
manda-chuvas da política beneficiaram-se não apenas da benevolência do
Judiciário, mas também da mão amiga do Congresso. É o caso de José Roberto
Arruda, ex-governador do DF. Correligionário de Bolsonaro, ele voltou ao jogo
eleitoral depois de o presidente do STJ, Humberto Martins, suspender os efeitos
das duas condenações dele por improbidade administrativa relacionadas à
Operação Caixa de Pandora, que investigou o Mensalão do DEM no DF. O ministro
baseou-se na nova Lei de Improbidade Administrativa, chancelada pelo parlamento
no ano passado, que abrandou os critérios para a penalização de agentes
públicos. O Planalto sabia da decisão antes do despacho e, em um acordo para
pacificar a base na capital, o presidente acertou a candidatura de Arruda a
deputado federal, ainda que ele pretendesse concorrer ao Palácio do Buriti. Com
o caminho livre, o ex-governador voltou às redes. “Desmorri”, escreveu, em tom
de brincadeira.
O
negociador de Lula
Há,
ainda, quem não busque o perdão do eleitor nas urnas, mas não abra mão do poder
da articulação nos bastidores. Condenado no Mensalão e um dos próceres do PT,
José Dirceu diz que a compra de votos pelo governo na era Lula “não existiu”. O
ex-ministro abriu mão de participar da coordenação de campanha do ex-presidente
para evitar um mal-estar, mas não deixou de ter voz e negocia em reservado.
Condenado a mais de 98 anos de prisão, o ex-governador Luiz Fernando Pezão tem
papel parecido: está longe dos holofotes, mas articula apoios a André
Ceciliano, candidato petista ao Senado pelo Rio.
E
há, também, os que sonhem com um milagre no Judiciário para retornar à
política. Primeiro governador a ser cassado em um processo de impeachment na
história da República e inelegível por cinco anos, Wilson Witzel submeterá seu
nome ao PMB para disputar mais uma vez o Palácio Guanabara. “O impeachment
contra mim foi um golpe. Não respondo a ações penais ou de improbidade. Minha
cassação foi resultado de uma investida de deputados de oposição que, depois,
tomaram conta do governo”, disse à ISTOÉ o ex-juiz, que acumula derrotas no
STF. Diante da reabilitação em massa de corruptos, percebemos que a repulsa da
sociedade pela política está longe do razoável.
Fonte: Artigo publicado originalmente pela Revista Isto É
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