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Cinco
anos depois de iniciar a venda de maconha em farmácias, encerrando o ciclo de
implementação da lei de regulamentação da marijuana aprovada em 2013, o Uruguai
dá sinais de ter construído um sistema estável de produção e consumo.
Hoje
há mais de 50 mil usuários inscritos e habilitados a comprar a erva nas 26
drogarias autorizadas em todo o país, a participar de clubes de cultivo ou a
semear e manter até seis pés da planta em casa. Venda em farmácias, clubes e
autocultivo são os três pilares da legislação aprovada na gestão do
ex-presidente José "Pepe" Mujica com o intuito de conter o
narcotráfico.
"Havia
muitos temores que não se confirmaram", afirma Sergio Redín, dono da
farmácia Antártida, em Montevidéu. "Havia o medo de que os
estabelecimentos fossem assaltados ou que os clientes mais conservadores deixassem
de comprar ali por preconceito. Não se vê isso mais hoje."
Em
19 de julho de 2017, quando as vendas nas lojas começaram, as filas eram de
dobrar quarteirões, e a produção, controlada pelo Estado mediante concessão de
licenças a empresas, se viu insuficiente para atender à demanda.
"Naquela
fase inicial foi mais difícil, pois o produto não chegava e havia confusão na
porta da farmácia e muita atenção da mídia, o que atrapalharam as vendas.
Depois, instalamos um método de reservas pela internet e retirada em horários
específicos. E a produção aumentou, hoje temos estoque em excesso", diz
Redín.
Os
usuários registrados, que devem ser uruguaios ou residentes -não é permitida a
venda a turistas-, têm direito de comprar dez gramas por semana. De acordo com
dados do Observatório Uruguaio de Drogas, 72% dos consumidores em farmácias
buscam o produto devido ao efeito relaxante e 47,7%, para minimizar distúrbios
do sono.
A
crítica mais comum de usuários que compram a droga em farmácias é a de que a
maconha oferecida nesses estabelecimentos tem pouco THC -o elemento psicoativo
que provoca alterações na percepção e pode modificar os estados de ânimo não
pode exceder 9% da composição do produto.
"O
ponto da legislação que melhor funcionou foi o do autocultivo, que barra
punições por plantar maconha em casa", diz Eduardo Blasina, ativista,
engenheiro agrônomo e diretor do Museo del Cannabis, na capital do país.
"Os clubes de cultivo têm regras demais, são difíceis de fiscalizar, não
funcionam tão bem. E as farmácias têm seu público, que é limitado e específico.
No geral, a lei ajudou a derrubar o estigma que havia na sociedade em relação
ao consumo de maconha."
Nos
clubes de cultivo, há um limite de sócios, 40, e de plantas, 99. Os que se
inscrevem para participar da associação escolhem um dos membros para cuidar de
todo o ciclo de produção, desde a plantação até a distribuição aos sócios.
"Funciona parcialmente, acho que coloca muitos limites que nos aprisionam
nessas regras, para que o governo tenha mais liberdade para explorar
comercialmente a produção em larga escala", afirma Guillermo Amandola,
dono de um clube de cultivo.
A
legislação permite que apenas empresas com licenças obtidas junto ao Estado
cultivem maconha para a produção de remédios, roupas e cosméticos. Atualmente
há empresas americanas, canadenses e espanholas instaladas no país com essa
finalidade.
Embora
a lei tenha hoje rejeição menor do que em 2013 -caiu de 44% para menos de 30%,
segundo o Instituto de Regulação e Controle da Cannabis-, há setores da
sociedade e da política que têm críticas e querem até mesmo derrubar a
legislação.
O
atual presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, que foi um defensor da
legalização da cânabis quando estava no Senado, aprova parte da lei. É a favor
da liberação do consumo e do comércio, mas se coloca contra a produção e
distribuição por parte do Estado. Em entrevista recente à rede BBC, defendeu
que "o governo não tem que plantar nem vender maconha". "Esse
trecho da lei eu não aprovei."
Um
setor mais à direita, parte da aliança governista, gostaria que a lei fosse
revogada. Guido Manini Ríos, senador e ex-comandante do Exército, líder do
partido Cabildo Abierto, por exemplo, afirma ser "abominável que o Estado
esteja competindo com narcotraficantes em vez de terminar de uma vez por todas
com o consumo de drogas".
No
exterior, as críticas vieram, entre outros, do presidente brasileiro, Jair
Bolsonaro (PL), que numa transmissão ao vivo recentemente disse que, "no
Uruguai, há uma explosão no número de homicídios devido, em grande parte, à
maconha".
O governo uruguaio respondeu por meio do ministro do Interior, Luis Alberto Heber: "Claro que não estamos de acordo com essa afirmação. Sobretudo porque a violência e muitos dos homicídios que ocorrem no Uruguai estão relacionados com a violência que vem do Brasil, nas zonas de fronteira. E no Brasil não está legalizada a maconha, mas há crime organizado. Precisamos manter a boa relação e, por isso, às vezes o mais indicado é o silêncio ou o cuidado com as palavras".
Com informações do FolhaPress
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