ARTIGO CIENTÍFICO: Matemáticos estão atrás de provas lógicas da existência de Deus; veja o que eles descobriram

Foto: Freepik

Artigo publicado na Revista Planeta

Muitos matemáticos tentaram provar a existência de um ser divino, como Blaise Pascal e René Descartes (no século 17), Gottfried Wilhelm Leibniz (no século 18) e Kurt Gödel (no século 20), cujos escritos sobre o assunto foram publicados somente em 1987.

No entanto, em um estudo de pré-impressão publicado pela primeira vez em 2013, um assistente de prova algorítmica verificou a cadeia lógica de raciocínio de Gödel e descobriu que estava correta. Será que a matemática realmente conseguiu refutar as alegações de todos os ateus?

Na verdade, não. Apesar de Gödel ter sido capaz de provar a existência de “algo” (que ele definiu como divino), a questão de se a descoberta dele se trata realmente da prova de uma existência divina fica um pouco mais complicada.

Enquanto Leibniz, Descartes e Gödel se basearam em uma prova ontológica de Deus na qual deduziram a existência de um ser divino a partir da mera possibilidade dele por inferência lógica, Pascal (1623-1662) escolheu uma abordagem ligeiramente diferente: ele analisou o problema a partir do ponto de vista do que pode ser considerado hoje como teoria dos jogos e desenvolveu a chamada “Aposta de Pascal”.

O argumento de Pascal estabelece que é melhor apostar na existência de Deus do que na tese oposta. Se existe um ser divino e se acredita nele, acaba-se no paraíso; caso contrário, vai-se para o inferno. Se, por outro lado, Deus não existe, nada mais acontece, independentemente de você ser religioso ou não. A melhor estratégia, segundo Pascal, é acreditar em Deus.

Porém, apesar de os pensamentos de Pascal serem compreensíveis, se referem apenas a cenários de escritos religiosos e não representam uma prova da existência de um ser superior. Abordagens ontológicas que lidam com a natureza do ser são mais convincentes, mesmo que provavelmente não mudem as mentes dos ateus.

O teólogo e filósofo Anselmo de Cantuária (1033-1109) apresentou suas ideias no início do último milênio. Ele descreveu Deus como um ser além do qual nada maior pode ser pensado. Mas se Deus não existe, então pode-se imaginar algo maior, um ser além do qual nada maior pode ser contemplado. Mas, como Deus, esse ser também existe e exibe uma propriedade de grandeza suprema. Assim, a suposição de que Deus não existe deve estar errada.

Descartes (1596-1650) revisitou essa ideia alguns séculos depois. Supostamente desconhecendo os escritos de Anselmo, ele forneceu um argumento quase idêntico para a existência divina de um ser perfeito. No entanto, depois de algumas décadas, Leibniz (1646-1716) retomou o trabalho e encontrou algumas falhas nele. Segundo ele, Descartes não havia demonstrado que as “propriedades perfeitas” de certas entidades, variando de triângulos a Deus, são compatíveis.

Leibniz continuou argumentando que a perfeição não poderia ser investigada adequadamente. Portanto, nunca poderia ser refutado que as propriedades perfeitas se unem em um ser. Assim, a possibilidade de um ser divino deve ser real. Assim, com base nos argumentos de Anselmo e Descartes, Deus existe.

Do ponto de vista matemático, no entanto, esses experimentos mentais tornaram-se realmente sérios apenas através dos esforços de Gödel. Aos 25 anos, o cientista mostrou que a matemática sempre contém afirmações verdadeiras que não podem ser provadas. Ao fazer isso, ele fez uso da lógica. Essa mesma lógica também lhe permitiu provar a existência de Deus.

Confira esses 12 passos compostos por um conjunto de axiomas (Ax), teoremas (Th) e definições (Df):

O pensamento de Gödel começa com um axioma, ou uma suposição. Se φ tem a propriedade P e de φ sempre segue ψ, então ψ também tem a propriedade P. Para simplificar, podemos supor que P significa “positivo”.

O segundo axioma estabelece ainda uma estrutura para P. Se o oposto de algo é positivo, então esse “algo” deve ser negativo. Assim, Gödel dividiu um mundo em preto e branco, ou algo é bom ou é ruim. Por exemplo, se a saúde é boa, então uma doença deve ser necessariamente ruim.

Com essas duas premissas, Gödel deriva seu primeiro teorema: se φ é uma propriedade positiva, então existe a possibilidade de existir um x com propriedade φ. Ou seja, é possível que coisas positivas existam.

Agora o matemático volta-se pela primeira vez para a definição de um ser divino: x é divino se possui todas as propriedades positivas φ. O segundo axioma assegura que um Deus assim definido não pode ter características negativas, caso contrário, uma contradição seria criada.

O terceiro axioma afirma que a divindade é uma característica positiva. Este ponto não é realmente discutível porque a divindade combina todas as características positivas.

O segundo teorema agora se torna um pouco mais concreto: combinando o terceiro axioma (a divindade é positiva) e o primeiro teorema (existe a possibilidade de que algo positivo exista), poderia existir um ser x que é divino.

Nos passos seguintes, Gödel mostra que Deus deve necessariamente existir na estrutura que foi apresentada. Ele introduz na segunda definição a “essência” φ de um objeto x, uma propriedade característica que determina todas as outras características.

O quarto axioma simplesmente afirma que se algo é positivo, então é sempre positivo, não importa o tempo, situação ou lugar. Em seguida, Gödel formulou terceiro teorema: se um ser x é divino, então a divindade é sua propriedade essencial. Se algo é divino, possui todas as características positivas e, portanto, as propriedades de x são fixas.

O próximo passo diz respeito à existência de um determinado ser. Se em algum lugar pelo menos um ser y possui a propriedade φ, que é a propriedade essencial de x, então x também existe. De acordo com o quinto axioma, a existência é uma propriedade positiva. Disso pode-se agora concluir que Deus existe porque este ser possui todas as propriedades positivas, e a existência é positiva.

As inferências lógicas de Gödel estão todas corretas, comprovadas até por computadores. No entanto, isso não resolve a questão final da existência de um (ou mais) seres divinos. Se a matemática é realmente a maneira certa de responder a essa pergunta existencial ainda é questionável.


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