Compostas por 253 deputados, as frentes parlamentares do Empreendedorismo (FPE) e do Comércio e Serviços (FCS) tratam como prioridade para este ano o aumento do limite de faturamento do Microempreendedor Individual (MEI). Aprovado há um ano e oito meses no Senado, o projeto de lei que sobe para R$ 130 mil o teto da receita bruta anual do MEI caminha a passos lentos na Câmara dos Deputados.
No
fim do ano passado, líderes de nove partidos assinaram um requerimento de
urgência para votação na Casa, mas a proposta continua no mesmo lugar. Desde
fevereiro, cinco parlamentares pediram para que o texto – cujo relator no
Plenário já está definido – fosse incluído na Ordem do Dia. A ideia é aumentar
a ofensiva para que o texto seja aprovado.
O
limite de receita bruta anual do MEI foi atualizado, pela última vez, em 2018.
Passou de R$ 60 mil para R$ 81 mil. Corrigir o teto é uma das reivindicações da
categoria, uma vez que a inflação acumulada pelo Índice Nacional de Preços ao
Consumidor Amplo (IPCA) neste período é de 34,4%. Fosse atualizado apenas pela
inflação de lá para cá, o faturamento máximo para que um empresário seja
enquadrado como MEI deveria estar na casa dos R$ 109 mil.
Marco
Antonio Rocha, professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp), aprova a revisão para cima do que os MEIs podem faturar
anualmente.
"Eu
acho que o limite poderia ser atualizado. É benéfico e, nesse sentido, o
projeto está correto. A gente está falando de uma receita bruta de quase R$ 10
mil por mês. Não é muito coisa. [O teto] de R$ 81 mil estava muito
desatualizado. A inflação de serviço foi bem alta, onde tem muito MEI. Boa
parte da economia dos centros urbanos é baseada em microempreendedores
individuais", avalia.
O
especialista acredita que isso pode trazer uma série de benefícios para a
competitividade desses microempreendedores, mas ressalta que a elevação do teto
produz outros efeitos indiretos.
"O
problema é que há uma série de brechas na forma de tributação e na legislação
trabalhista que induzem ao que a gente chama de pejotização. Quando a gente
amplia esse limite tributário existe o efeito benéfico em relação à
competitividade desses microempreendimentos e à capacidade de geração de
emprego e renda, por um lado, mas, por outro lado, existe o impacto que isso
produz na forma de contratação das grandes empresas. Tudo isso tem que ser
levado em consideração".
Prejuízo
Um
dos principais argumentos daqueles que defendem o aumento do teto é o princípio
da "justiça tributária". A falta de atualização dos limites conforme
os índices oficiais, como a inflação, acaba por tirar do regime aqueles que
antes estavam como destinatários pela lei.
Imagine
uma cabeleireira que teve um faturamento bruto de R$ 77 mil no ano passado –
média de R$ 6,4 mil por mês. Segundo o IBGE, a inflação em 2022 foi de 5,79%.
Se essa empreendedora quiser corrigir os serviços prestados pela inflação para
não perder dinheiro este ano e, além disso, apenas manter o fluxo de
atendimento do ano passado, ela terá faturado R$ 81,4 mil ao fim de 2023,
ultrapassando o teto do MEI e sendo obrigada a migrar para a
microempresa.
Na
prática, ainda que ela atenda a mesma quantidade de pessoas do ano passado e
não tenha aumento no faturamento real, terá ultrapassado o limite do MEI.
Coordenador
da FCS, o deputado federal Domingos Sávio (PL-MG), explica que esses
trabalhadores são prejudicados pela não revisão do teto, o que incentiva
irregularidades.
"O
MEI logo precisa ou parar de trabalhar, porque senão ele ultrapassa, ou ele tem
que buscar caminhos ilícitos, ou de produzir sem emissão de nota ou pegar nota
emprestada com outro colega e isso não é o que nós queremos para a
microempresa. Nós queremos que a microempresa também possa crescer. Agora, com
um teto de limite de faturamento defasado, esse segmento está sendo duramente
prejudicado e a economia brasileira está sendo prejudicada", afirma.
Membro
da FPE, o deputado federal Jorge Goetten (PL-SC) diz que a não correção dos
valores têm como consequência a sonegação por parte dos microempreendedores e,
também, o desestímulo à continuação da empresa ao longo do ano, o que impacta a
economia.
"Não
é só importante, como urgente. Esse teto deveria ser até retroativo, porque tem
muitas empresas que já perderam a possibilidade de continuar no regime do
Simples porque estouraram o teto. E mais ainda, não só sonegar. Tem muitas
empresas que param de vender lá no quarto trimestre, porque senão vão estourar
o teto. Necessariamente tem que alterar o teto para valores reais. Só falta a
Câmara votar e não tenho dúvida nenhuma que os colegas deputados vão
aprovar", aposta.
Mudanças
Várias
foram as propostas ao longo dos últimos anos para que o limite de faturamento
do MEI fosse ampliado. A que mais vingou foi o projeto de lei complementar
108/2021, cuja autoria é do senador Jayme Campos (União–MT).
Além
de ampliar o teto do MEI para R$ 130 mil, o texto aprovado no Senado permite
que o microempreendedor individual tenha até dois funcionários e não apenas um,
como atualmente.
Na
Câmara dos Deputados, o projeto foi aprovado com alterações pelas comissões de
Finanças e Tributação (CFT) e Constituição e Justiça (CCJ). Na CFT, o relator,
o deputado federal Marco Bertaiolli (PSD-SP), propôs que o teto seja corrigido
considerando a inflação acumulada desde 2006.
Naquele
ano, ainda não existia a figura do MEI, mas havia o "microempresário
individual" – "figura jurídica correspondente" – cujo limite
anual de receita bruta era de R$ 60 mil. Ao corrigir esse valor pela inflação,
o parlamentar calculou que o teto para o enquadramento do MEI deva ser de R$
144.913,41. Além disso, o texto do projeto de lei prevê a correção automática
desse limite anualmente, de acordo com o IPCA.
História
Criado
há quinze anos por meio da Lei Complementar 128/2008, o MEI foi uma aposta do
governo para reduzir a informalidade no mercado de trabalho e, ao mesmo tempo,
garantir o aumento da arrecadação.
Isso
porque embora tenha condições simplificadas para o pagamento de impostos, o
microempreendedor individual paga mensalmente tributos como o ISS (para
prestadores de serviços), ICMS (para quem é do comércio, indústria ou
transportes) e ainda contribui para o INSS.
O economista Ciro de Avelar diz que o aumento do teto para enquadramento dos microempreendedores individuais contribui para a arrecadação dos municípios. "As prefeituras podem se favorecer muito desse reenquadramento. Até porque, diferentemente da União, os estados e os municípios não podem emitir títulos para se financiar. É necessário buscar uma reestruturação tributária para ofertar esses serviços públicos para a população. E tem que ter fiscalização para que esse aumento seja utilizado em benefício da população".
Segundo
o Data Sebrae, o país tem mais de 12 milhões de MEIs.
Postar um comentário