Milhares
de prefeitos cumpriram a promessa de fechar as portas das prefeituras na última
quarta-feira (30), em protesto contra a forma que o governo distribui os
recursos que arrecada do cidadão através de impostos. A principal causa da
paralisação, programada para durar apenas um dia, diz respeito à queda dos
valores do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e ao atraso das emendas
parlamentares. Além disso, a maioria dos gestores municipais reclama que o
governo e o Congresso Nacional criam despesas obrigatórias e não geram maneiras
de as prefeituras cumprirem com os pagamentos destas despesas.
A
paralisação foi programada para acontecer apenas em um dia, como forma de
alertar as autoridades para a situação dos municípios, mas as lideranças
municipalistas planejam outras formas de protestar, caso as reivindicações não
sejam atendidas.
De
acordo com a Confederação Nacional de Municípios (CNM), o movimento saiu do
Nordeste, onde havia começado na semana passada e atingiu milhares de
cidades, chegando a 16 estados do país.
Pela
manhã, a CNM divulgou manifesto público, repetindo o alerta de que “os
municípios brasileiros vivem uma crise estrutural”. O documento, assinado pelo
presidente da entidade, Paulo Ziulkoski, relembra informações divulgadas
recentemente, em primeira mão, pelo portal de notícias Brasil 61: subiu de 7%
para 51% o número de prefeituras endividadas, operando no vermelho e correndo o
risco de os prefeitos serem enquadrados na Lei de Responsabilidade Fiscal (
LRF) por estarem gastando mais do que arrecadam. Ou seja, o assunto não é
novidade, para quem acompanha o cotidiano da política no país.
Além
de traçar um histórico das ações em que os prefeitos vêm alertando o governo
para a crise que enfrentam, o documento da CNM aponta soluções que poderiam
amenizar a situação (veja detalhes, ao longo desta reportagem).
Crise
atinge municípios pequenos
O
cenário que levou as prefeituras de pelo menos 16 estados a promoverem a
paralisação é o mesmo enfrentado por prefeituras como a de Cristais (MG), cujo
prefeito, Djalma Carvalho (DEM), demitiu 10% dos servidores de todos os setores
da Administração municipal. O problema é mais grave, quando se trata de cidades
pequenas, onde a arrecadação de ICMS é baixa e que não dispõem de alternativas
para movimentar a economia local, fazendo com que o município seja considerado
"pobre", em comparação a outros.
Na
Bahia, um dos estados onde o movimento se iniciou, o prefeito de Irecê, Elmo
Vaz, do PSB, declarou à reportagem que a UPB (União das Prefeituras da Bahia)
repassou dados de que mais de 50 % das prefeituras paralisaram as atividades.
“Em Irecê, a prefeitura só está atendendo emergências de saúde, além dos
serviços de limpeza urbana, coleta de lixo e o setor de tesouraria, que não
podem paralisar”, informou.
No
Ceará, outro estado que como a Bahia e Paraíba, foi um
dos precursores do protesto — o radialista Humberto Elery, da
Rádio Brisa FM Rede Conexão Regional, informou por telefone que no município de
Tianguá (CE) apenas os serviços considerados "essenciais" foram mantidos:
"A prefeitura local decretou ponto facultativo em todos os órgãos da
Administração Pública Direta, autárquica e fundacional do Poder
Executivo". Segundo o profissional de comunicação, a maioria dos
municípios da região seguiram o mesmo caminho.
Conforme
o Brasil 61 relatou na edição de segunda-feira passada, dezenas de municípios
de Santa Catarina aderiram ao movimento e cruzaram os braços em protesto.
Segundo a Fecam (Federação de Consórcios, Associações e Municípios de
Santa Catarina), entidade que lidera 21 associações de municípios do estado,
representando os 295 municípios catarinenses, a maioria das prefeituras do
estado fecharam as portas. A atitude foi
aplaudida pela Famurs (Federação dos Municípios do Rio Grande do Sul).
A entidade gaúcha não aderiu ao protesto, mas apoia incondicionalmente o
movimento.
Apoiaram,
mas não aderiram
Muitos
prefeitos manifestaram apoio ao protesto, mas ainda não aderiram à paralisação,
como protesto. É o caso de Igarapava (SP), onde o prefeito José Ricardo, do
MDB, atual presidente do Comam (Consórcio dos Municípios da Alta Mogiana),
afirmou que a prefeitura não entrou em greve, mas ressaltou que apoia
o movimento.
“Não
paramos porque estamos com uma gestão fiscal quase excelente e conseguimos
manter as contas”, explicou. “Muito embora nos desagrade bastante as reduções
dos repasses do governo federal, prejudicando nosso planejamento e a
continuidade de projetos”.
Da
mesma forma, o prefeito de Viradouro (SP), Cal Ribeiro, do PTB, disse que a
prefeitura não fechou as portas na quarta-feira porque ainda tinha demandas
urgentes para serem resolvidas. Viradouro é cidade ligada ao Codevar (Consórcio
de Desenvolvimento do Vale do Rio Grande), entidade que envolve vários
municípios que, segundo Ribeiro, estão apoiando o movimento dos prefeitos
“principalmente por causa da queda nos repasses de recursos e dos saldos
devedores que a União teria com as prefeituras locais desde 2017.
“Isso
afeta muito a economia dos municípios e também a gestão, a administração
pública das prefeituras, que nesse momento de escassez de recursos, de crise,
causa um dano muito grane”, justificou.
O
prefeito de Taquaral (SP), Paulinho Cardoso, do MDB, afirmou que na região de
seu município os prefeitos ainda não decidiram se vão parar. “A gente está
conversando, porque está tudo muito difícil por causa da queda do FPM, do ICMS
e o repasse das emendas parlamentares em atraso. Está ficando cada dia mais
difícil governar.
Choradeira
geral
Mesmo
entre prefeitos que ainda planejam ações para protestar contra a situação, a
choradeira é geral. E as reclamações ocorrem também por parte
de prefeitos de Goiás. O prefeito de Planaltina de Goiás (GO), Delegado
Cristiomário, do PSL, disse que está ouvindo os comandos das entidades
regionais e nacionais que atuam na defesa da causa municipalista, antes de
decidir fechar as portas da prefeitura. Além da queda do FPM, Cristiomário
acrescentou que a criação de obrigações para que os municípios cumpram, sem a
criação de condições para o cumprimento,são as principais causas dos problemas.
“Estamos
passando sérias dificuldades financeiras decorrentes principalmente da redução
no FPM e também dos aumentos das despesas decorrentes de algumas propostas
vindo do próprio governo federal, como piso de enfermagem, piso de professores
e hoje nós precisamos de muita ajuda. As prefeituras de Goiás também devem
estar junto nesse mês de setembro, fazendo algum tipo de ação”, afirmou.
CNM
aponta soluções
A
Confederação Nacional de Municípios (CNM) divulgou manifesto nesta quarta-feira
(30), assinado pelo presidente da entidade, Paulo Ziulkoski. O documento
relembra que “os municípios vivem uma crise estrutural”. Os detalhes da crise
detalhada por Ziulkoski foram destacados em recente entrevista concedida por
ele exclusivamente ao Brasil 61, onde o representante da CNM declarou que só
uma reforma fiscal, alterando a forma de distribuição dos impostos recolhidos
pela União Federal, poderia evitar a falência da maioria dos municípios
brasileiros.
No
Manifesto de quarta-feira (30), a Confederação demonstra o cenário que levou
prefeituras de 16 estados a promoverem os protestos desta quarta-feira.
Ziulkoski alerta que “não há condições de governabilidade”, e reforça as pautas
que poderiam amenizar a atual crise financeira.
Ao
final do documento divulgado pela entidade, Paulo Ziulkoski aponta soluções
que, na visão da diretoria da CNM, não resolveriam definitivamente o problema
mas “com certeza” podem amenizar a situação: “A aprovação da proposta que
aumenta o FPM em 1,5% (PEC 25/2022); a redução da alíquota patronal do INSS
para 8%; a recomposição do ICMS (PLP 94/2023); a atualização dos programas
federais defasados (PEC 14/2023) e a ampliação da Reforma da Previdência para
os Municípios (PEC 38/2023)”.
Outro
lado: posição do governo
A
Secretaria de Relações Institucionais (SRI) do Palácio do Planalto informou,
através de sua assessoria de Imprensa, que faria uma reunião ainda na
quarta-feira (30) com os representantes de entidades municipalistas e o
deputado Zeca Dirceu, líder do PT na Câmara e relator do projeto de lei que
visa repassar R$ 27 bilhões para estados e municípios, com objetivo de
compensar perdas de receitas com o ICMS.
Até
o fechamento desta reportagem, os resultados desta reunião ainda não haviam
sido divulgados pelo governo ou pela Liderança do PT na Câmara dos Deputados.
“Cabe
destacar que o governo do presidente Lula é um governo municipalista, que
sempre atuou pelo fortalecimento e desenvolvimento dos municípios. Prova disso
é que, nestes primeiros oito meses, atendeu diversas demandas que estavam
represadas nos últimos anos, como o reajuste nas transferências para a merenda
escolar, a elevação nos repasses para o Sistema Único de Saúde e a oferta de
recursos para investimento em diversos equipamentos sociais, contemplados no
PAC”, conclui a Nota.
As
assessorias de imprensa do Ministério da Fazenda e do Ministério das Cidades
não responderam os telefonemas e e-mails encaminhados pela reportagem.
Fonte: Brasil 61
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