Carrancas são símbolo de proteção e viraram identidade cultura das populações que vivem às margens do Rio São Francisco. Crédito: reprodução
Em um esforço para preservar e celebrar a tradição cultural das carrancas na Bahia, a equipe de Patrimônio Cultural de Fiscalização Preventiva Integrada do Estado (48ª FPI/BA) realizou um mapeamento dos mestres produtores de carrancas para tornar o ofício Patrimônio Cultural Imaterial.
Os dados coletados serão enviados em um relatório para o Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC) e para o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) para avaliação do pedido de patrimonialização. O prazo para que o reconhecimento seja oficializado é indeterminado, pois precisa passar por alguns processos burocráticos, mas segundo o arquiteto do Iphan, João Gustavo, que acompanhou o mapeamento dos mestres carranqueiros, a riqueza e importância cultural da atividade são inegáveis.
“Dizemos
que a atividade já é patrimônio, o que se faz é apenas reconhecê-lo. Diversos
depoimentos de mestres artesãos destacam a necessidade de preservar essa
expressão única de identidade baiana e também de nível nacional e
internacional”, afirma João.
Popularmente
conhecidas como objetos de proteção, as esculturas esculpidas em madeira são
acima de tudo um símbolo da cultura juazeirense e fonte de renda dos seus
mestres produtores.
Segundo
explica o artista plástico Alex Moreira, que possui uma dissertação de mestrado
sobre a história das carrancas, o objeto era encontrado como figuras de proas
em barcos vikings, usados como amuletos protetores contra os perigos das águas.
Com
o cruzamento cultural do Brasil Colônia, o objeto ganhou novas funções depois
de passar pelo Rio São Francisco, em Juazeiro. Além de símbolo de proteção,
passou a ser usado para embelezar os barcos e, mais tarde, depois de também
cair em desuso, entrou nas casas, museus e lojas de arte.
Foi
transformado em símbolo cultural de Juazeiro, em especial do Rio São Francisco
e ofício de muitos artesãos que nasceram nessa terra. “É um formato único,
riquíssimo, que não vamos encontrar nada igual em lugar nenhum”, destaca Alex.
Para
desenvolver o relatório a ser enviado ao IPAC e ao IPHAN, a equipe de
Patrimônio Cultural da FPI visitou e entrevistou artesãos, nos municípios de
Juazeiro e Jaguarari, responsáveis por darem formas e cores às tradicionais
carrancas e manterem viva a tradição de um ofício artístico que é passado de
geração a geração.
Entre
eles, o artesão carranqueiro Flávio Motta, que se destaca pela criação da maior
carranca do mundo, com 6 metros de altura. Ele começou a esculpir as carrancas
aos 16 anos, com a intenção de conquistar um amor e não parou mais.
“É
um trabalho que me conecta com a natureza, a qual eu sempre estive ligado. Não
há desmatamento nem prejuízos a ela, porque usamos madeiras que já encerraram o
seu ciclo. Ou seja, nasceram, viveram e caíram”, conta Flávio.
A
madeira usada pelos mestres carranqueiros é umburana. Segundo Flávio, eles
costumam coletar os troncos em áreas de mata. O número de artesãos que ainda
fazem as carrancas, no entanto, caiu bastantes, como o carranqueiro do povoado
de Carnaíba do Sertão, em Juazeiro, que se apresentou a equipe FPI apenas como
Djalma.
“Djalma
nos disse que o número de carranqueiros no povoado tem caído com o tempo, e que
Carnaíba do Sertão já chegou a ter 160 artesãos produzindo carrancas”, relata o
coordenador da equipe Patrimônio Cultural, Diogo Vasconcellos.
A
patrimonialização do ofício vai garantir o seu reconhecimento e facilitar a
criação de editais e políticas públicas que garantam mais oportunidades aos
carranqueiros e maior incentivo à prática, garantindo a preservação.
Texto e foto: Emilly Oliveira, com orientação de Monique Lôbo/ Correio 24 horas.
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