Por Gabriel Stargardter e Lisandra Paraguassu
RIO
DE JANEIRO/BRASÍLIA (Reuters) - Uma declaração incomum da agência de espionagem
israelense Mossad afirmando que ajudou a impedir um ataque do Hezbollah em
território brasileiro se tornou o mais recente incidente a prejudicar as
relações entre Israel e Brasil, tendo como pano de fundo o conflito em Gaza.
Na
quarta-feira, a Polícia Federal prendeu duas pessoas acusadas de terrorismo
como parte de uma operação para desmontar uma suposta célula do Hezbollah que
planejava ataques no Brasil. Mais tarde, o Mossad agradeceu publicamente à PF e
disse que, "dado o pano de fundo da guerra em Gaza", o Hezbollah
continuava atacando alvos israelenses, judeus e ocidentais.
Os
comentários do Mossad irritaram o ministro da Justiça e Segurança Pública,
Flávio Dino, que respondeu com uma dura repreensão a Israel nesta quinta-feira
na plataforma X, dizendo que "o Brasil é um país soberano" e que
"nenhuma força estrangeira manda na Polícia Federal do Brasil".
Ele
não negou explicitamente qualquer detalhe da declaração israelense, mas pareceu
mais irritado com o momento, o tom e a ligação com a atual guerra em Gaza.
Dino
afirmou que as investigações que resultaram nas operações de quarta-feira
"começaram ANTES da deflagração das tragédias em curso na cena
internacional", e disse que a investigação "nada tem a ver com
conflitos internacionais".
"Apreciamos
a cooperação internacional cabível, mas repelimos que qualquer autoridade
estrangeira cogite dirigir os órgãos policiais brasileiros, ou usar
investigações que nos cabem para fins de propaganda de seus interesses
políticos", escreveu ele.
O
governo de Israel não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.
Uma
fonte da PF disse que Dino ficou irritado porque a declaração do Mossad fez
parecer que o Brasil estava recebendo ordens de Israel, o que poderia ser
percebido como se estivesse tomando partido na guerra.
Em
nota, a PF repudiou as declarações feitas por "autoridades
estrangeiras" sobre a operação e disse que "cabe exclusivamente às
instituições brasileiras definir os encaminhamentos e conclusões sobre fatos
investigados em território nacional".
Os
comentários de Dino podem piorar as relações com o governo israelense no
momento em que o Brasil tenta negociar uma saída segura para cerca de 30
brasileiros ainda presos em Gaza.
O
Brasil tem se irritado cada vez mais com Israel devido à lentidão na
libertação, segundo duas fontes. O Ministério das Relações Exteriores disse a
Israel nesta semana que a relação diplomática se tornaria insustentável se
qualquer dano acontecesse aos brasileiros, disseram as fontes.
Diplomatas
brasileiros disseram à Reuters que não conseguiam entender por que Israel
estava demorando para libertá-los, enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva tem equilibrado as críticas aos ataques do Hamas com pedidos de
cessar-fogo.
Um
número cada vez maior de países latino-americanos tem assumido uma posição mais
dura em relação a Israel por causa do bombardeio retaliatório em Gaza após os
ataques do Hamas em 7 de outubro. No final do mês passado, a Bolívia cortou os
laços diplomáticos com Israel, enquanto a Colômbia e o Chile repatriaram seus
embaixadores.
O
governo brasileiro também ficou irritado quando o embaixador de Israel no
Brasil, Daniel Zonshine, durante uma visita ao Congresso na quarta-feira, tirou
fotos sentado ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros políticos de
extrema-direita antes de uma reunião privada.
Em
uma entrevista ao jornal O Globo após a operação da PF na quarta-feira,
Zonshine disse que "se (o Hezbollah) escolheu o Brasil, é porque tem gente
que os ajuda".
Nesta
quinta-feira, o chefe da PF, Andrei Rodrigues, disse à imprensa que os
comentários de Zonshine foram uma "surpresa negativa e um
"mal-estar".
O
Hezbollah, um grupo apoiado pelo Irã no Líbano, não pôde ser contatado
imediatamente para comentar o assunto, nem o governo iraniano.
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