STF, mais uma vez, subverte a lei!

Os ministros do STF Alexandre Moraes e Dias Toffoli/ Crédito: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

( *) Valber Bernat


Em julho deste ano, Alexandre de Moraes e seus familiares declararam terem sido hostilizados por brasileiros que o reconheceram no Aeroporto internacional de Roma, quando regressavam ao Brasil. Segundo Moraes, o grupo o ofendeu e agrediu fisicamente seu filho, que, de acordo com ele, levou um tapa no rosto. O caso é investigado pela Polícia Federal.


Na prática, o ocorrido seria apenas um bate-boca comum entre passageiros, não fora um deles um ministro do STF, com todos os privilégios que detém sobre os acusados. As imagens gravadas, pelo serviço de vigilância do aeroporto, não mostraram agressão alguma, o que só foi mostrado agora quando os réus tiveram acesso a elas.


Na faculdade, em Processo Penal, aprendemos que um erro, se não for eliminado, tem dentro de si a semente de outro erro, e daí de mais um, e assim por diante. Resumindo: fruto de árvore podre é podre! A decisão de condenar o acusado a qualquer custo, como “exemplo” do castigo que aguarda os desafetos do STF, é um clássico deste tipo de coisa.


Nesta semana, o ministro Toffoli, relator do inquérito que investiga as supostas agressões, atendeu ao pedido das supostas vítimas para que elas se tornassem assistentes de acusação. Precedente gravíssimo e privilégio absurdo!


Em um processo, que surpreendeu pela rapidez em seu andamento, a despeito da diferença gritante de posições entre acusador e réus, o STF confere, aos autores da denúncia, um privilégio incompatível com os princípios republicanos da igualdade, da legalidade e da própria democracia, em afronta ao artigo 268 do Código de Processo Penal”. O processo ainda está na fase investigativa. Ainda não foi oferecida a denúncia ao MPF, portanto a figura do assistente de acusação não deve sequer ser mencionada.


As imagens, em sua totalidade, ainda não foram liberadas para os réus, apenas para os acusadores. Os réus só tiveram acesso integral apenas àquelas liberadas pelo STF. A diferenças de tratamento continua! Por que os acusadores tiveram amplo e irrestrito acesso às imagens e os réus ainda não? Como contestar uma prova se você não tem conhecimento dela?


O que justifica a defesa não ter o direito, de ela fazer a seleção que for benéfica aos interesses defensivos de seus clientes?


O acesso às mídias que registraram o ocorrido é questionado pela PGR. Segundo o documento, o sigilo configura ‘condição inusitada’ que obrigada a PGR a comparecer às dependências do STF para tomar conhecimento do conteúdo integral. “Essa inusitada condição implica restrição ao amplo e irrestrito acesso à prova já analisada pela Polícia Federal, cujas constatações constam de relatório já formalmente documentado nos autos, e que tem o Ministério Público como destinatário”.


As cópias fornecidas à defesa estão editadas, impedindo a defesa de periciar o arquivo, ou mesmo de checar todas a sequência das imagens.


A defesa da família dos réus – Roberto Mantovani Filho, Andrea Munarão e Alex Zanatta Bignotto – diz que: “O que merece muita atenção por parte de toda a comunidade jurídica é que, qualquer exceção que exista neste caso específico, que envolve um ministro da Suprema Corte, pode criar precedente em frontal desrespeito à legislação”


Em parecer apresentado ao Supremo, o perito contratado pela defesa comparou a forma como o vídeo pode ser acessado por eles – nos computadores da Corte, em Brasília, sem acesso a cópias, a uma “sessão de cinema”, alegando a impossibilidade de periciar o arquivo em sua totalidade.


Daí, mais uma vez, uma decisão monocrática de um ministro do STF – Dias Toffoli – dá uma volta na lei e permite que Alexandre de Moraes e família funcionem como assistentes de acusação no processo que movem contra os réus.


A PGR discorda da decisão de Toffoli dizendo que: “há um privilégio incompatível com o princípio republicano, da igualdade, da legalidade e da própria democracia”. Eliminando-se o exagero de incluir a democracia em sua contestação, tendo a concordar com tudo o que disse a PGR interina Elizeta Ramos.


Para o MPF, a decisão “institui privilégio, de natureza pessoal, a um Ministro da própria Suprema Corte; compromete a eficácia da persecução penal; e desrespeita as funções constitucionais do Ministério Público, no seu poder-dever constitucional de, privativamente, dar início à ação penal pública”.


Isso pode desidratar e subtrair a independência funcional do Ministério Público.


A função de assistente de acusação é prevista em nosso Código de Processo Penal, dizendo que o ofendido pode intervir, como assistente do MP. A lei prevê esta assistência somente na fase de processo, conforme diz o CPP e as inúmeras decisões anteriores do próprio STF. A partir do momento em que um juiz concede a alguém esse status, a pessoa tem alguns direitos, como apresentar alegações finais e interpor recursos, em conjunto ou separadamente do MPF.


No entanto, o referido artigo não proíbe, expressamente, que ele atue na fase de inquérito… mas precisava?


Aí está a subversão na decisão de Toffoli!!!


No caso presente, o fato ainda está em fase de investigação, ou seja, na fase de inquérito. O assistente de acusação ainda não seria possível de ser adotado, conforme eu disse anteriormente, por decisões do próprio STF..


Enfim, a decisão monocrática de Toffoli pode mudar o rumo do processo contra os réus, privilegiando os autores da queixa – Ministro Alexandre de Moraes e família – contra os réus, como se já não bastasse a situação profissional dos entes envolvidos no processo.


Admitir a assistência na fase atual – inquisitorial – desvirtua, inconstitucional e ilegalmente o instituto da acusação, que permite às vítimas a interveniência na ação pública, mas jamais de conduzir ou produzir provas no inquérito policial.


A decisão dá um privilégio desigual a um ministro (colega) da Suprema Corte, comprometendo a eficácia do processo penal, desrespeitando o MPF no seu dever constitucional e privadamente, de dar início à ação penal pública.


Não se tem notícia de precedente de admissão de assistência à acusação na fase inquisitorial!!! 


(*) Advogado, analista de TI e editor do site.


Fonte: Artigo publicado, originalmente, no O Boletim



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