(*) Valter Bernat
Vou usar uma linda – e bem-humorada – crônica do mestre Veríssimo para encerrar o ano do Boletim.
Crônica de Ano Novo – (por Luis Fernando Veríssimo)
“Existem
muitas superstições sobre a melhor maneira de entrar o Ano Novo. Na nossa casa,
por exemplo, nunca falta um prato de lentilha para ser consumido nos primeiros
minutos do ano que começa. Dá sorte. Ouvi dizer que na Espanha, ao soar da
meia-noite, deve-se comer uma uva para cada badalada do relógio. Este costume
chegou à Bulgária mas, por uma falha na tradução, lá se come um melão para cada
batida do relógio, e os hospitais ficam cheios no dia 1º. Na Suíça, comem o
relógio.
Algumas
crenças persistem através do tempo, desafiando toda lógica. Se o champanhe
aberto à meia-noite não estourar e se tiver alguém na família chamado Edgar, é
sinal de que a casa será arrasada por uma manada de elefantes e o champanhe
está choco. Na Rússia, depois de brindarem o Ano Novo com vodca, os convidados
devem atirar suas taças contra a parede e depois ficar muito brabos porque não
há mais copos na casa e atirar o anfitrião contra a parede. De qualquer
maneira, a festa termina cedo.
Na
Índia se a primeira criança que nascer no Ano Novo tiver bigode, fumar de
piteira e pedir para falar urgentemente com o Kofi Anan, é mau sinal. Na
Polinésia, em certas tribos primitivas, o guerreiro mais audaz deve levar a
virgem mais bonita até a boca do vulcão e atirá-la para a morte, como um
sacrifício aos deuses. Mas a encosta do vulcão é comprida, os dois param para
descansar um pouco e, quando chegam à boca do vulcão, estabelece-se o paradoxo:
se o guerreiro era audaz, a moça não é mais virgem, se a moça ainda é virgem, o
guerreiro não era audaz, e o sacrifício sempre fica para o ano que vem. Na
Austrália, todos se atiram contra a parede.
Entrar
o Ano Novo de gravata borboleta pode comprometer seriamente as relações entre o
Oriente e o Ocidente. O primeiro animal que você encontrar na rua no Ano Novo
pode significar uma coisa. Cachorro é sorte. Gato é dinheiro. Rato é saúde. Um
bando de hienas é azar, corra. Um cavalo roxo dançando o xaxado na calçada
significa que você está bêbado. Vá dormir.
Em
certos lugares, é costume derramar champanhe no decote da mulher ao seu lado, o
que lhe trará, a longo prazo, bons negócios, e, a curto prazo, um tapa-olho. Se
você estiver num réveillon junto com seu patrão, não esqueça de se colocar
estrategicamente para ser o primeiro a abraçá-lo à meia-noite. Dance com a
mulher dele. Insista para que ele dance com a sua. Proponha vários brindes.
Pule em cima da mesa. Proponha mais brindes. Diga que agora você é quem vai
dançar com o patrão e não quer nem saber. Acabe lhe dizendo algumas verdades.
Proteste que ninguém precisa segurar você, você está sóbrio, entende? Sóbrio!
Só não sabe como uma manada de elefantes roxos invadiu o salão, ou será que a
mulher do patrão trouxe a família toda? No dia 1º você não se lembrará de nada.
No dia 2, você vai procurar outro emprego. Chato.
Outro
costume é fazer previsões na véspera do Ano Novo. Pode chover. Alguém, em algum
lugar do Brasil, está dizendo: “Boas-entradas nada, eu quero saber onde
fica a saída”… e a previsão mais fácil de todas…
–
Qual é?
–
Amanhã eu vou estar de ressaca!
Enfim,
o Ano Novo já está quase aí e, apesar de muita gente no Brasil telefonar para
os parentes no Japão, onde o 2013 chegará mais cedo, querendo saber que tal o
ano, como quem pergunta como é que está a água, ninguém sabe como ele será.
Farei o possível para entrar nele com o pé direito, mas, quando perceber, ele é
que terá entrado em mim, não dará para recuar.
Só
sei uma coisa. Assim que o relógio terminar de bater a meia-noite, comerei meu
prato de lentilha para dar sorte. Pedirei outro. E derramarei lentilha no colo,
destruindo para sempre:
a) um bom par de calças;
b) minha fé em qualquer tipo de superstição.”
(*) Advogado, analista de TI e
editor do site.
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