Funeral do jovem palestino Ali Abu Aliya, morto por soldados israelenses I Foto: AFP
Por: Taciano Medrado
Olá carissimo (a)s leitore(a)s,
Em
tempos de conflitos no Oriente Médio entre Israel e o Hamas, algumas expressões
idiomáticas tomam da mídia pelo mundo. E um dos termos frequentemente usados é
o de SHARID.
O martírio é um dos
conceitos importantes do Islã, e diz respeito não apenas ao sacrifício e à
entrega da própria vida em benefício do coletivo, da Ummah (Nação) islâmica
Mas
o que significa SHARID?
Os
mártires ocupam um espaço especial nos corações e nas mentes dos palestinos. Na
Declaração de Independência da Palestina, escrita pelo poeta palestino Mahmoud
Darwish e proclamada por Yasser Arafat, em 15 de novembro de 1988 em Argel,
Argélia, é feito um juramento de luta sem tréguas perante e em honra do
sacrifício e do sangue de milhares de mártires palestinos que caíram na luta,
fonte de inspiração e esperança para os que lutam para pôr fim à ocupação e
estabelecer a soberania e a independência da Palestina.
O
martírio é um dos conceitos importantes do Islã, e diz respeito não apenas ao
sacrifício e à entrega da própria vida em benefício do coletivo, da Ummah (Nação)
islâmica. Segundo o Islã, são mártires (Shahid, em árabe) aquelas pessoas que
sofrem perseguição e que morrem no campo de batalha, enfrentando o inimigo por
uma causa justa e legítima; quem morre para salvar outros; as vítimas
inocentes; e o não muçulmano que morre lutando por uma causa justa ou pelo seu
país.
Nesse
contexto, o mártir é, antes de tudo, um Mujahideenou fida’yyin, um
guerrilheiro da resistência palestina, um combatente muçulmano disposto ao
sacrifício da própria vida por uma causa baseada na justiça e na luta contra a
opressão. No Alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos, está dito: “E não creais
que aqueles que sucumbiram pela causa de Allah [Deus] estejam mortos; ao contrário,
vivem, agraciados, ao lado do seu Senhor” (3:169).
O
martírio também denota o exercício do Jihad, palavra árabe que significa
“empenhar-se”, “luta”, “esforço” para conseguir algo, esforçando-se, nesse
caso, por justiça ou contra a injustiça. O esforço pela defesa e segurança
da Ummah islâmica indica que todo muçulmano tem o dever de lutar em
favor do seu irmão de fé e defender a comunidade em geral contra as ameaças
estrangeiras e as arbitrariedades internas.
Ao
longo de séculos, o povo palestino deu milhares de mártires à sua causa de
libertação, que remonta às batalhas contra cruzados, romanos, persas, otomanos,
britânicos e, nos últimos 73 anos, judeus sionistas vindos da Europa para
implantar um projeto colonial de supremacia judaica na Palestina.
Em
2002, um grupo de mais de 70 intelectuais palestinos, incluindo os nomes de
Mahmud Darwich, Rima Tarazi, Georges Ibrahim, Jamal Salsa, Izzat Ghazzawi e
Mazen Saadeh, divulgou um manifesto contra mais uma das operações militares
israelense naquele ano. Num dos trechos, eles citam a dura realidade em que “Os
vivos são privados do direito básico à vida, e aos mártires se rejeitam túmulos
para um repouso em paz. Acima de tudo, porém, o que vemos agora é a expressão
do desejo de um povo que não tem outra escolha a não ser resistir.”
Quando
os cristãos conquistaram Jerusalém pela primeira vez, em 1099, o que se viu foi
um massacre, a partir do qual foram martirizados centenas de não cristãos
(infiéis). Quando Salah ad-Din Yusuf ibn Ayyub (Saladino) reconquistou
Jerusalém, em 1187, temia-se um massacre contra os não muçulmanos. Contudo,
Saladino, no alto do seu poder militar, deu mostras do mesmo respeito e da
mesma compaixão pelos habitantes cristãos que o califa Omar havia dedicado
cinco séculos antes, permitindo que recolhessem seus mortos e lhes dessem um
tratamento adequado. (1)
Recentemente,
relembramos o martírio do líder histórico da Organização para Libertação da
Palestina (OLP), Yasser Arafat, que entregou sua alma ao Criador na manhã de 11
de novembro de 2004, no Hospital Militar Percy, em Paris. Arafat lutou por 13
infindáveis dias contra doença que, depois se soube, havia sido motivada por
envenenamento por Polônio-210, por parte de “Israel”, conforme estudos de
legistas da Suíça, Rússia e França. Após os resultados das análises, sua
esposa, Suha Arafat, declarou que estava revelado “um verdadeiro crime, um
assassinato político. Está cientificamente provado que ele não morreu de morte
natural.” (2)
Arafat
se dizia um soldado palestino, que usaria sua arma para defender não apenas ele
mesmo, mas também todas as crianças, as mulheres e os homens palestinos e a
existência da Palestina. Certa vez, ele questionou em uma entrevista à Agência
Reuters: “Há alguém na Palestina que não sonhe com o martírio?”. “Israel”
recusou permitir que Arafat fosse enterrado no terreno da Mesquita de Al-Aqsa,
em Jerusalém, cidade onde nasceu. Seus restos mortais estão no memorial
construído ao lado de onde funcionou a Mukata’a, o seu escritório em Ramallah.
Outros
mártires são reverenciados pelos palestinos, como o Sheikh Ahmad
Yassin, um dos fundadores do Movimento de Resistência Islâmica (Hamas), que
havia sobrevivido a duas tentativas de assassinato. A primeira, em 2002,
ocorreu no distrito de Sabra, na cidade de Gaza; e a segunda, em setembro de
2003, quando uma bomba foi lançada sobre um prédio onde vários líderes do Hamas
estavam reunidos.
O Sheikh Ahmed
Yassin foi um homem conhecido por sua alta moral, força de vontade,
determinação, sabedoria de como administrar as organizações islâmicas, visão
profunda das questões relacionadas à causa palestina e atitude firme de não
ceder nenhum centímetro da Palestina, independentemente das consequências. Foi
martirizado num ataque seletivo do Mossad em Gaza, no dia 22 de março de 2004,
quando um helicóptero disparou um míssil que o atingiu enquanto se deslocava em
sua cadeira de rodas pelas ruas da cidade, vitimando também mais nove mártires
palestinos.
Em
22 de julho de 2002, aviões de guerra israelenses lançaram uma bomba de uma
tonelada que destruiu totalmente o prédio em que morava Salah Shehada, matando
18 palestinos, incluindo Shehada, sua esposa e uma de suas filhas, de 14 anos
de idade, além de seguranças e outras crianças. Shehada é o fundador do
primeiro ramo militar do Hamas, denominado Al-Mujahidoon Al-Filistiniyoon (Os
Mujahideen Palestinos), depois transformado nas Brigadas Izzi ad-Din al-Qassam,
o maior e mais bem equipado grupo que opera hoje em Gaza, cujo nome é uma
referência ao clérico Izz ad-Din al-Qassam, um pregador muçulmano nascido na
Síria em 1882.
Glória
eterna à memória dos homens e das mulheres, de todas as raças e credos
religiosos, que são mártires da luta contra as injustiças e ousaram conquistar
a liberdade, a soberania e a autodeterminação de seus povos. O sangue dos
mártires continuará sendo o combustível para a luta pela liberdade palestina
contra a ocupação colonial israelense.
Referências:
(1)
TENÓRIO, Sayid Marcos. Palestina: do mito da terra prometido à terra da
resistência. 1. ed. São Paulo: Anita Garibaldi, IBRASPAL, 2019, p. 54.
(2)
Evidências sustentam teoria de envenenamento de Arafat, dizem peritos.
Disponível em:
https://www.reuters.com/article/mundo-suica-arafat-morte-idBRSPE9A609920131107.
Acesso em: 15 nov. 2021.
Fonte: O artigo foi publicado,
originalmente, por por Sayid Marcos Tenório
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