Não
há mais dúvida: o Brasil gira em torno de Lula. Esse arremedo de Luís 14
considera que a história dele e a do PT são a “garantia”, segundo suas próprias
palavras, de que a democracia brasileira existirá “inabalável” no País.
O
demiurgo petista detalhou sua teoria lulocêntrica perto do final de seu
discurso por ocasião do evento de anteontem, em Brasília, que lembrou o
primeiro aniversário da tentativa de golpe de Estado promovida por hordas
bolsonaristas.
Era
para ser um pronunciamento adequado ao momento solene – no qual era preciso
enfatizar o papel das instituições na resistência à barbárie dos liberticidas
que, insuflados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, pretendiam criar o caos a
partir do qual, conforme seus delírios, produzir-se-iam uma ruptura e o
estabelecimento de um regime de exceção liderado por tiranetes bolsonaristas.
Lula
até que salientou, corretamente, “a coragem de parlamentares, governadores e
governadoras, ministros e ministras da Suprema Corte, ministros e ministras de
Estado, militares legalistas e, sobretudo, da maioria do povo brasileiro”
naquele dia infame.
No
entanto, em vez de ater-se ao script à sua frente, cujo tom, malgrado alguns
exageros retóricos, parecia no geral correto, Lula foi fiel à sua vocação
palanqueira e transformou aquela cerimônia de defesa da democracia em comício
para atacar seus adversários e louvar a si mesmo e a seu partido – exatamente
como previam os vários governadores de oposição que, por essa razão, se
recusaram a comparecer.
Lula
chamou Bolsonaro de “golpista” e fez diversas insinuações de malfeitos do
ex-presidente. No trecho do discurso em que claramente estava improvisando – e,
portanto, foi mais autêntico –, Lula chegou a sugerir que os três filhos de
Bolsonaro que se elegeram para cargos políticos renunciassem a seus mandatos em
protesto contra as urnas eletrônicas, que, dizem os extremistas bolsonaristas,
foram fraudadas para impedir a reeleição do ex-capitão.
Ora,
não era isso o que se esperava do estadista que Lula julga ser. Nem se discute
que a cantilena bolsonarista contra a lisura das urnas eletrônicas era e é
profundamente antidemocrática, como já dissemos repetidas vezes neste espaço,
mas Lula, na condição de presidente da República e sendo o principal orador de
um evento voltado à celebração da democracia e à pacificação nacional, deveria
ter se limitado a louvar a manutenção do regime de liberdade e de respeito à
lei.
Mas
a natureza é implacável. Lula não conhece outra língua senão a do
enfrentamento. Aproveita todo e cada momento para estimular o rancor contra
aqueles que considera seus inimigos, o que é particularmente inapropriado no
momento em que as autoridades públicas, sobretudo o presidente da República,
têm o dever de esfriar os ânimos e buscar convergências.
No
mesmo fôlego em que atacou duramente seus adversários políticos numa cerimônia
supostamente apolítica, Lula foi capaz de declarar que a democracia brasileira
viceja, vejam só, porque ele e o PT existem. “Eu queria dizer para vocês, e
sobretudo aos companheiros da Suprema Corte e ao presidente do Tribunal
Superior Eleitoral: quando alguém colocar dúvidas sobre a democracia no Brasil,
seria importante que vocês não tivessem receio de utilizar a minha história e a
história do meu partido como garantia da existência inabalável da democracia
neste país”.
Mais
autorreferente do que nunca, o presidente mostra que nada aprendeu com os fatos
recentes. Se a democracia resistiu ao 8 de Janeiro, foi em razão da força de
suas instituições, testadas até o limite nos últimos anos, e da união da
sociedade, que ignorou suas diferenças para derrotar um de seus maiores inimigos.
O mérito é de muitos, inclusive de alguns que se ausentaram ou que não se
sentiram representados no evento comemorativo.
É
realmente lamentável que uma data que tinha tudo para se firmar como uma
efeméride relevante para a democracia brasileira tenha sido convertida por Lula
em uma festa em louvor a si mesmo e à companheirada. Do mesmo modo que
Bolsonaro tentou sequestrar o 7 de Setembro, Lula quer se apropriar do 8 de
Janeiro. Se depender dos verdadeiros democratas, não conseguirá.
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