(*) Percival Puginna
Estávamos
num programa de debates sobre direitos humanos. Lá pelas tantas, um dos meus
interlocutores falou em “dignidade da pessoa humana”. Eu os sabia marxistas e,
portanto, materialistas. Perguntei-lhes, então, como um desafio: qual o
fundamento da dignidade da pessoa humana?
Sabia
que essa questão coloca o materialismo e seus adeptos num beco sem saída. Para
respondê-la, o microfone correu a mesa. Falaram, falaram e nem de longe
trataram do tema. Quando retornou a mim, chamei a atenção para o fato de que
não haviam me dado qualquer resposta. Mencionada por materialistas, a dignidade
da pessoa humana é mera retórica.
Ante
a provocação que fiz, um deles saiu-se com esta: “O fundamento da dignidade da
pessoa humana é a reciprocidade nas relações”. Ora, salta aos olhos que a
reciprocidade, vale dizer, a equidade nas relações e trocas interpessoais e
sociais, pode ser, em alguns casos, fundamento da justiça, mas nem de longe
serve como alicerce para a dignidade do ser humano. Em determinadas situações
talvez seja apenas consequência.
Entendamos
isso porque é importante. Quem vive em situação de carência mental, material ou
física tem, como pessoa, dignidade igual à da mais eminente celebridade e à da
mais justa e generosa das criaturas. E em quase nada pode o desvalido
contribuir para a tal reciprocidade. Exigi-la em certos casos pode ser puro e
duro egoísmo. Há ocasiões em que a reciprocidade, como critério de justiça, se
fundamenta na dignidade da pessoa humana, mas o que nela se sustenta não lhe
pode servir, também, como suporte.
Enfim,
a questão que propus é irrespondível pelo materialismo. Se tudo é matéria,
instinto e razão, o ser humano é apenas o mais complexo dos animais. E somente
isso. Resulta, assim, meramente retórica toda menção que marxistas façam à
dignidade humana. A prova provada me veio logo após, quando, tendo eu comentado
a animalização conceitual da pessoa, se vista apenas como ser material, meu
interlocutor da ocasião afirmou que “os animais também têm dignidade”. Foi ou
não uma rendição? Homem e bicho é tudo a mesma coisa? Animais merecem respeito,
mas a eminente dignidade, fundamento das melhores constituições, quem a tem é o
ser humano.
Há
muito proponho essa questão em debates e ainda não encontrei um materialista
que fizesse a respeito dela qualquer afirmação consistente. Falam sobre
direitos humanos como parte de uma agenda muito mais ideológica do que
efetivamente humana. O humanismo sem Deus é um humanismo desumano, reafirmou
recentemente Bento XVI na encíclica Caritas in Veritate. Com efeito, somente o
revelado à tradição judaico-cristã satisfaz como resposta à questão contida no
primeiro parágrafo deste artigo. É por isso que nela se fundamenta toda uma
civilização e o que há de melhor em sua cultura: o homem é imagem e semelhança
de Deus, e objeto de Seu amor.
Alguém poderá dizer: “Eu sou ateu e trato com respeito os meus semelhantes”. Sei disso, no entanto, é preciso perceber: a conduta civilizada que independe de identitarismos tem base cultural. É a cultura de uma civilização que herdou princípios da preciosa fonte judaico-cristã. Reinstituir os identitarismos é, por assim dizer, um retorno ao paganismo.
Fonte: Percival
Puggina
(*)
Arquiteto,
empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores, colunista de
dezenas de jornais e sites no país. Membro da Academia Rio-Grandense de
Letras. Escreve, semanalmente, artigos para vários jornais do Rio Grande do
Sul, entre eles Zero Hora, além de escrever o seu próprio blog e em outros
websites de expressão nacional, a exemplo do Mídia Sem Máscara, Diário do
Poder, Tribuna da Internet. Sua coluna é reproduzida por mais de uma centena de
jornais.
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