foto ilustrativa
Pesquisa
divulgada nesta segunda-feira (19) pelo Itaú Social revela que a qualidade dos
empregos ligados à matemática é muito maior em termos de resiliência às
situações de crise do que a de outras ocupações não vinculadas a essa
disciplina, porque são cargos que demandam mais especialização. Durante a
pandemia da covid-19, os trabalhos intensivos em matemática tiveram queda de
6,8%, enquanto as demais ocupações mostraram retração de 13,1%.
“A
gente vê o quanto o emprego reage e a proporção de empregos se mantém estável,
mesmo em momentos de crise: o grau de formalidade desses empregos e o nível
salarial são mais altos do que a média dos empregos brasileiros, mesmo quando
considerados entre as pessoas que têm ensino superior completo”, disse à Agência
Brasil a gerente de Avaliação e Prospecção do Itaú Social, Fernanda
Seidel.
“Ou
seja, se a gente pega um trabalho intensivo em matemática, [de autor] com
ensino superior completo, e compara com um trabalho não intensivo em
matemática, embora feito [por alguém com ensino superior completo], na média, o
salário daquele trabalho é o dobro.” Embora os trabalhos vinculados à
matemática sejam bons e tenham renda maior, eles reproduzem as desigualdades
observadas na aprendizagem da matemática desde o ensino básico, em especial
entre meninas e pessoas negras, englobando pretos e pardos, que apresentam
desempenho bem mais baixo que os brancos do sexo masculino, explicou Fernanda.
Outra
conclusão importante do estudo é que, diferentemente do que ocorre em outros
países, o Brasil emprega um número baixo de pessoas ligadas às profissões
vinculadas à matemática, que são mais resilientes e geram mais renda. Por isso,
destaca a pesquisa, o país precisa acompanhar melhor esse quadro e se preocupar
mais no sentido de política pública de desenvolvimento.
Desigualdade
O
estudo mostra predominância de trabalhadores formais entre as ocupações ligadas
à matemática, que correspondem a 84% do total, contra a média da economia
brasileira, que registra cerca de 67% de trabalhadores neste mercado formal,
embora tais profissões tenham participação maior de pessoas brancas (66%) e de
homens (69%) do que a média das demais atividades no país. Sessenta e dois por
cento de tais trabalhadores têm ensino superior completo.
Segundo
Fernanda, isso está refletindo muito a desigualdade de aprendizagem da educação
básica em que meninas e pessoas negras têm desempenho mais baixo em matemática,
embora o número de trabalhadores negros em profissões ligadas à disciplina
tenha aumentado de 33% para 36%, entre 2012 e 2023, e a participação das
mulheres tenha evoluído de 28% para 31% no mesmo período. “Ou seja, que
oportunidades de aprendizagem na educação básica elas estão tendo, que
perspectivas, que sonhos podem fazer que elas se enxerguem também como pessoas
capazes de trabalhar e de gostar de matemática desde crianças?”, questionou
Fernanda.
Provocação
O
estudo Contribuição da Matemática para a economia brasileira foi
feito pelo Itaú Social a partir de uma provocação do Instituto de Matemática
Pura e Aplicada (Impa), que acompanha levantamentos semelhantes em vários
países, e seguiu metodologia adotada em pesquisas pelo Centro Nacional de
Pesquisa Científica da França (CNRS), adaptada às características do mercado
brasileiro.
“Alguns
países europeus têm a preocupação de acompanhar e aumentar o número de empregos
da matemática, entendendo como isso é estratégico para o desenvolvimento do
país, porque são carreiras do desenvolvimento científico e que têm todos esses
atributos salariais e de resiliência”, apontou Fernanda Seidel. Os resultados
evidenciaram que, no Brasil, tanto o percentual de empregos relacionados à
matemática, como o que eles correspondem em termos do Produto Interno Bruto
(PIB, que é a soma dos bens e serviços produzidos no país) são mais baixos do
que nos países europeus que fazem políticas públicas muito focalizadas na
aprendizagem e nas profissões relacionadas à matemática.
No
mercado de trabalho do Brasil, há menor participação dos empregos da matemática
(7,4%) do que nos países europeus estudados, cuja média é de 10%. Do mesmo
modo, é menor a contribuição média anual dos rendimentos desses trabalhadores
como percentual do PIB, que foi de 4,6%, no período de 2012 a 2022, do que no
PIB francês (18%).
Lacuna
O
objetivo da pesquisa era apurar a importância da matemática para a economia
brasileira, entendendo o gap, ou lacuna, existente no país em relação a
nações europeias fator de preocupação.
As
ocupações ligadas à matemática oferecem salários 119% superiores à média dos
demais trabalhadores. No terceiro trimestre do ano passado, por exemplo, a
média salarial deles foi R$ 3.520, o que significa mais que o dobro da média
das demais categorias (R$ 1.607) no período.
Embora
a proporção dos trabalhadores ligados à matemática tenha se mantido entre 7% e
8% no total de pessoas empregadas de 2012 a 2022, o crescimento desses
profissionais no período de dez anos foi superior ao do mercado de trabalho
total, com taxa média anual de 1,98%, em comparação ao percentual dos ocupados
em geral (0,99%).
Os
dados sobre a idade média dos trabalhadores vinculados à matemática revelam que
oscilou entre 36,9 e 38,6, com leve tendência de aumento ao longo dos anos.
Como a idade média do trabalhador brasileiro era de 39,3 anos no primeiro
trimestre de 2023, percebe-se que os profissionais envolvidos em atividades
matemáticas são um pouco mais jovens que a média nacional. Segundo o estudo, o
grupo de profissionais com habilidades matemáticas por faixa etária cresceu,
particularmente entre os trabalhadores de 22 a 46 anos, no período de 2016 a
2023. No primeiro trimestre do ano passado, 80% das pessoas que trabalhavam em
áreas ligadas à matemática tinham menos de 48 anos.
A
pesquisa mostra ainda que a maioria dos trabalhadores relacionados à matemática
se concentra nas regiões Sudeste e Sul, com os estados de São Paulo, Rio de
Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná abrigando mais da metade
desses profissionais.
Benefícios
O
estudo pretende mostrar como o Brasil poderia se beneficiar economicamente de
um maior aprendizado em matemática e, em consequência, das profissões com curso
superior que demandam competências dessa área. De acordo com a superintendente
do Itaú Social, Patricia Mota Guedes, os dados apurados evidenciam a
importância do investimento em educação matemática de qualidade. Para Patrícia,
o estudo indica as potencialidades oferecidas pela disciplina, ensinada desde a
educação básica, e sua influência no futuro dos jovens. “O levantamento traz
dados concretos para sensibilizar cada vez mais o poder público, setor
produtivo e sociedade de forma ampla sobre a relevância da matemática para o
desenvolvimento de um país.”
O
estudo usou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua para
avaliar o número de trabalhadores e suas remunerações associadas às atividades
relacionadas à matemática. O cálculo da contribuição para o PIB foi considerado
a partir da soma de todos os rendimentos do trabalho no país provenientes de
ocupações que demandam maior intensidade de capacidades matemáticas.
No
Brasil, as ocupações da matemática estão mais concentradas nas áreas de
serviços administrativos e de tecnologia da informação do que em áreas mais
tradicionalmente ligadas à inovação e desenvolvimento tecnológico, como
engenharia e pesquisa, como ocorre nos países europeus.
Estratégia
O
diretor-geral do Impa, Marcelo Viana, considera que o impacto da matemática na
economia de cada país é uma excelente medida do seu grau de desenvolvimento e
que o Brasil ainda tem uma estrada significativa a percorrer para se equiparar
às economias mais avançadas. Para Viana, isso poderá acontecer por meio de
investimentos estratégicos em educação, aproveitando o potencial da matemática
para gerar riqueza e desenvolvimento no país.
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Fonte: Revista Isto É
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