Disclaimer: o presidente citado no título é Lira, não Lula.
Historicamente o Brasil
subverte fatos que pesquisadores renomados jamais diriam ser possível. Fazemos
o contrário do que afirma a lógica. Invertemos conceitos que toda a tradição
científica consagrou. Temos como derrubar a Lei de Newton. Somos uma espécie de
Pátria-Mãe da Eterna Exceção à Regra. E há exemplos para todos os gostos, em
todos os campos de atuação. Desde o tal Dom Pedro. O cara, da família que
era dona do Brasil, foi quem declarou a independência para continuar dona do
Brasil (hahahahaha). A partir dessa piada de mau gosto a gente cresceu no
endividamento, na desigualdade e na maldade. Por estes cantos zoados de mundo
inverter tudo é a lei maior. Somos lugar em que exibir vídeos de assassinatos
em veículos de mídia no meio da tarde é corriqueiro. E por que não? Afinal,
somos o país que mais mata no planeta (47.722 mortes violentas pelo dado mais
recente, o que dá 10,4% do total global).
Mais
aberrações? Nestes 135 anos como República, os militares, golpistas e ditadores
foram os donos do poder por pelo menos meio século, coisa de 40%. . Somos um
lugar miscigenado que flertou com o nazismo alemão. Até os Estados Unidos nos
colocarem contra a parede no terço final da Segunda Guerra. Por aqui, parte
relevante do empresariado, da elite econômica e dos grandes veículos de
comunicação defendeu e patrocinou golpe de Estado — atitude nada republicana,
repita-se. E dá-lhe auxílio moradia de 10 paus para o topo do MP como se tudo
isso não tivesse nada a ver com aquilo tudo. A gente não precisa de M&As
para ampliar nosso espaço de destruição institucional. Fazemos isso
organicamente.
Nesse
balaio há dois exemplos recentes deste Modus Operandi Invertido no campo da
política & economia. O primeiro é o quanto o brasileiro — inclusive
suas elites letradas e autodenominadas progressistas — confundem o que é o
liberalismo. O termo liberal virou xingamento. Dá pra entender. A palavra
foi apropriada pela maioria do parlamento e por nomes da pequenez de Jair
Bolsonaro. O Partido Liberal daqui é o único do mundo que ama o Estado gordo,
inchado e generoso (com eles). Nossos liberais ocupam comandos em banco estatal
(hahahahahaha).
Esse
Contradictio in adiecto é ao mesmo tempo o sintoma e a doença, a causa e a
consequência. E um paradoxo semântico. Algo como o Partido Nazista ser liderado
por um judeu (OK, isso já ocorreu, nos Estados Unidos dos anos 60, com a figura
de Daniel Burros). Pois é esse tipo de psicopatia conceitual que nos impede de
virarmos adultos político-econômicos. Mal saber o que é liberalismo é o
primeiro exemplo de nosso Modus Operandi Invertido. O segundo é a derrota de
Lula contra Lira. Pelo menos até este round, em fevereiro de 2024. O presidente
palaciano está nas cordas, levando uma surra do presidente parlamentar.
Acabar
com as reonerações? Esqueça. Impedir que o Congresso domine o orçamento de
ministérios, estatais e autarquias? Esqueça. Cortar emendas de comissão?
Esqueça. Responsabilidade fiscal? Esqueça. O Orçamento Secreto está vivo e
forte. Escoa pelos caminhos de sempre: Educação & Saúde + Infraestrutura.
Ah, mas não se chama mais Orçamento Secreto. Bem, enquanto um animal peludo que
abana o rabo e anda com quatro patas ladrar, eu chamarei de cachorro. Se miar,
cogito chamar de gato.
A
sequência de jabs e cruzados é tamanha que Lula boicota até quem o salvaria,
como Fernando Haddad e, por tabela, Simone Tebet — para alegria escancarada de
muitos dos colegas destes dois. Sob nossos olhos paralisados, o Brasil de
Arthur Lira transformou-se em uma República Parlamentarista. Rasgou-se a
Constituição. Numa maneira diferente à de 1961, mas com a mesma desfaçatez. Foi
pro lixo o referendo de 1963. Foi pro lixo o plebiscito de 1993. Foi pro lixo o
presidencialismo de Lula III de 2023. Em seis décadas repetimos a história.
Como farsa. Como drama. E como tragédia. Por aqui, a expressão ‘Para Inglês
Ver’ ganha concorrente: ‘Era de Lula, É de Lira’. Chamar o governo de Lula III
de ‘Parlamentarismo à Brasileira’ me parece mais adequado. Porque enquanto o
animal peludo que abana o rabo e anda com quatro patas ladrar, eu chamarei de
cachorro. Se passar a miar, volto a chamar de gato. Nessas, colocar na projeção
reformas (como a Administrativa) para dar consistência e tração à economia é
perder tempo.
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