A prisão de deputados federais já custou à Câmara mais de R$ 2,8 milhões em dinheiro público. Esta é a soma, em valores nominais, dos benefícios pagos pela Casa a parlamentares que não tiveram os pagamentos de salário, verbas de gabinete e cota parlamentar suspensos durante o período em que estiveram detidos em regime fechado ou prisão domiciliar desde 2013. Considerando os seis deputados federais presos na última década, a Câmara já pagou R$ 2.836.751 a deputados virtualmente impedidos de exercer a atividade parlamentar.
Os benefícios aos quais um deputado federal têm direito não são revogados tão logo o parlamentar seja preso. Só há a suspensão dos pagamentos em caso de cassação do mandato ou por determinação da Mesa Diretora. Os vencimentos são mantidos até que haja alguma disposição em contrário, mesmo que o deputado esteja virtualmente impedido de trabalhar. A única penalidade ao parlamentar preso, na prática, é o desconto de um trinta avos do salário a cada “ausência não justificada”.
Em nota, a Câmara alega que a suspensão das
prerrogativas de um parlamentar detido “seria antecipar os efeitos de eventual
condenação, o que seria incompatível com o princípio de presunção de inocência,
da ampla defesa e do contraditório”. No entanto, há precedentes divergentes. Já
houve casos como os de Natan Donadon (PMDB-RO), Celso Jacob (PMDB-RJ) e Paulo Maluf (PP-SP), que tiveram salários e benefícios
suspensos assim que foram presos.
Por outro lado, em outras ocasiões, deputados
federais passaram meses sem exercer o mandato, mas continuaram sendo pagos pela
Casa. São os casos de João Rodrigues (PSD-SC), preso de fevereiro a junho de 2018
e que gerou um custo de mais de R$ 600 mil aos cofres públicos, e Daniel Silveira (PSL-RJ), detido entre fevereiro e novembro
de 2021, ao custo de quase R$ 1,6 milhão. Também é o caso de Chiquinho Brazão,
que permanece recebendo benefícios mesmo estando em prisão preventiva desde o
dia 24 de março. Só em abril, o mandato de Brazão, apontado como um dos
mandantes da execução da vereadora Marielle Franco, em 2018, custou R$ 169 mil.
A Constituição Federal de 1988 instituiu novas
regras para a prisão de parlamentares no exercício do mandato. O primeiro caso
com a vigência da atual Constituição aconteceu em 2013, com o ex-deputado
federal Natan Donadon. Ele foi condenado em 2010 por peculato e formação de
quadrilha, mas recorreu da decisão e postergou em três anos o início do
cumprimento da pena. Em 28 de junho de 2013, o deputado foi preso por
determinação do Supremo Tribunal Federal (STF).
Dias depois, em 9 de julho, a Mesa Diretora suspendeu os benefícios a Donadon. Mesmo preso, o sistema da Câmara aponta que, em julho de 2013, houve o pagamento de R$ 20.942,58 ao deputado, a título de verba de gabinete. Além disso, de julho a agosto daquele ano, as despesas de cota parlamentar de Donadon somam R$ 944,66.
Uma representação contra Donadon foi instaurada no Conselho de Ética da Câmara e chegou à votação do plenário em 28 de agosto. Houve 233 votos a favor da cassação, ante 131 contrários e 41 abstenções. Como eram necessários ao menos 257 votos para que o parlamentar fosse cassado, o mandato foi mantido. Mesmo assim, Henrique Alves (PMDB-RN), então presidente da Casa, afastou Donadon e convocou o suplente. Meses depois, em fevereiro de 2014, o mandato de Natan Donadon foi cassado de forma definitiva. A pena do ex-deputado foi perdoada em 2017, com o indulto natalino do então presidente Michel Temer (MDB)
Um membro da Câmara só voltaria a ser preso durante o exercício do mandato em 2017. Celso Jacob foi condenado por fraude em uma licitação durante o período em que foi prefeito de Três Rios, no Rio de Janeiro. Em maio daquele ano, houve o esgotamento dos recursos na Justiça e o STF ordenou que o então deputado começasse a cumprir a pena imediatamente. Em 6 de junho, Jacob foi preso pela Polícia Federal (PF).
Ele permaneceu detido até o dia 27 daquele mês, quando obteve autorização da Justiça para cumprir a pena no semiaberto. Mesmo detido em regime fechado durante três semanas do mês, os benefícios de junho foram pagos normalmente pela Câmara: R$ 33 mil em salário bruto, R$ 97.463,82 em verba de gabinete e R$ 1.891,29 de cota parlamentar entre os dias 6 e 22 daquele mês - ou seja, já excluído do cálculo o período em que o deputado estava solto.
Jacob passou o segundo semestre daquele ano cumprindo a pena em regime semiaberto: de dia, ele comparecia à Câmara e exercia o mandato; à noite, dormia no Complexo da Papuda, em Brasília (DF). Essa rotina perdurou até novembro, quando o deputado foi flagrado tentando entrar na cadeia com biscoitos e queijos escondidos na roupa íntima. Ele acabou sendo punido, indo para a ala solitária do presídio. Em paralelo, no dia 24 de novembro, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) suspendeu a medida judicial que o autorizava a exercer o mandato enquanto cumpria a pena.
Paulo
Maluf
Em dezembro de 2017, a Câmara passaria a ter dois membros presos por determinação do STF. Em maio, Paulo Maluf foi condenado pelo Supremo por lavagem de dinheiro durante o período em que foi prefeito de São Paulo. Os recursos foram esgotados no último mês do ano e o ministro Edson Fachin determinou o início imediato do cumprimento da pena.
Em fevereiro, Rodrigo Maia (DEM-RJ) afastou Maluf do mandato e convocou o suplente. Quatro meses depois, em junho, Celso Jacob conseguiu uma medida judicial para retornar à Câmara. Paulo Maluf, por outro lado, teve o mandato cassado em agosto.
João
Rodrigues
João
Rodrigues foi o primeiro deputado federal detido que continuou a receber os
benefícios da Câmara sem disposições em contrário. Condenado por fraude em uma
licitação quando foi prefeito de Pinhalzinho (SC), o STF ordenou o cumprimento
imediato da pena de Rodrigues em 6 de fevereiro de 2018. Dois dias depois, ele
foi detido pela PF. Mesmo preso em regime fechado durante quatro meses, não
houve revogação dos benefícios.
Rodrigues retornou à Casa por meio de uma medida judicial em junho de 2018, quando passou a conciliar o cumprimento da pena, em regime semiaberto, com as atividades parlamentares. Em agosto, foi candidato à reeleição e obteve votos suficientes para se eleger, mas o registro da candidatura foi indeferido pela Lei da Ficha Limpa. Hoje, é prefeito de Chapecó, em Santa Catarina.
Daniel Silveira
Em 16 de
fevereiro de 2021, Daniel Silveira foi preso preventivamente por determinação
do STF, ao publicar um vídeo com ofensas aos ministros da Corte. Três dias
depois, o plenário da Casa manteve a prisão do deputado. Ele permaneceu em
regime fechado até março, quando obteve uma liberação para prisão domiciliar.
Em junho, ele retornou ao regime fechado por descumprir medidas cautelares,
permanecendo assim até novembro, quando pôde retomar o mandato.
Mesmo preso, Silveira teve direito ao adiantamento de gratificação natalina, um benefício dos servidores da Câmara pago no mês de junho que, em 2021, rendeu R$ 9 mil ao deputado detido. Dos mais de R$ 300 mil em salários brutos pagos a Silveira no período, o deputado recebeu, em valores líquidos, R$ 179.938,52.
Chiquinho Brazão
Chiquinho
Brazão é apontado pela Polícia Federal (PF) como um dos mandantes
da execução da vereadora Marielle Franco, em 2018. Mesmo sem
comparecer presencialmente à Câmara desde 24 de março, quando foi decretada sua
prisão preventiva, ele continua a ser pago pela Casa.
Em abril, por exemplo, o
mandato de Brazão custou R$ 169.469,36 aos cofres públicos. Do salário bruto de
mais de R$ 44 mil, o deputado recebeu, após descontos, R$ 24.099,58.
Fonte: Estadão
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