O
debate público sobre os efeitos das mudanças climáticas ganhou ainda mais força
aqui no Brasil quando o chamado “racismo ambiental” foi recentemente trazido à
reflexão; inclusive, nas discussões do G-20. A
ideia por trás desse conceito é a relação objetiva entre as desigualdades
sociais e a exposição real de populações marginalizadas aos riscos e
consequências dos eventos climáticos e ambientais.
A
cada ano, quando chuvas torrenciais atingem cidades brasileiras causando
grandes enchentes, deslizamentos, mortes e desalojamentos nas regiões mais
pobres e periféricas dos centros urbanos, observamos a evidente relação entre a
proporção das tragédias ocorridas e a disponibilidade ou escassez de
investimentos financeiros em direitos e infraestruturas para populações de
baixa renda. Essa relação de causalidade entre financiamento e desigualdades se
repete em diferentes dimensões.
A
presidência brasileira do Grupo dos 20, este ano, tem a oportunidade histórica
de colocar essa relação de causalidade sobre a mesa e reafirmar a necessidade
de integrar cada vez mais os múltiplos temas da agenda pública que afetam e
determinam a vida das pessoas: saúde, educação, clima, cidades, agricultura,
energia e trabalho, por exemplo, aos instrumentos de coordenação financeira
global dos 20 países mais ricos do planeta.
E,
somado a esse contexto, este ano também se celebram os 80 anos dos Acordos
de Bretton Woods. Eles estabeleceram as bases do modelo de cooperação
econômica internacional que vigora até hoje, tendo originado instituições como
o Banco
Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI). Embora o objetivo de
Bretton Woods tenha sido contribuir para o progresso mundial, não é difícil
encontrar indicadores que atestam a ampliação das desigualdades entre nações
ricas e não ricas e dentro dos próprios países.
Algo
deu muito errado e é a população periférica que sente diariamente as
consequências de um modelo econômico mundial que está aquém das necessidades
contemporâneas. Esse fato traz o imperativo de o G-20 também ser um fórum que
advoga e impulsiona a reforma das instituições multilaterais de cooperação
econômica a fim de possibilitar respostas mais céleres para os desafios
ambientais e climáticos em suas múltiplas dimensões, sobretudo para a população
menos assistida.
Em
paralelo e coordenado com os esforços de rever mecanismos de financiamento
multilateral, organizações filantrópicas, bancos de desenvolvimento, empresas e
organizações da sociedade civil podem e devem se comprometer com os governos na
missão máxima do G-20; qual seja, fomentar que a prosperidade do planeta e dos
países seja equânime.
Essas
organizações têm, no marco do G-20, a chance de contribuir com a construção de
soluções que o mundo e a humanidade urgem. Como produtores de inteligência e
conhecimento, esses setores também podem apresentar, nesta edição do fórum,
caminhos reais para compromissos mais ambiciosos e que respondam firmemente aos
desafios territoriais e globais.
A
transversalidade da questão climática com outras áreas do saber humano é,
portanto, necessária e fundamental para conectar, associar e integrar os
diferentes temas em favor da solução de um desafio comum: a sobrevivência e
regeneração do planeta.
Para
resolver as recorrentes tragédias derivadas de racismo ambiental nas periferias
brasileiras, por exemplo, é preciso transversalizar investimentos em infraestrutura
urbana — saneamento e habitação, especialmente — com soluções conectadas à
preservação da natureza. Da mesma forma, assegurar direitos à saúde e educação
para populações expostas a riscos ambientais por meio de mecanismos financeiros
que tornem possível o afluxo de recursos, nesse sentido.
Algumas
barreiras a esta indiscutível transversalidade — assertivamente defendida pelo
G-20 e outros fóruns — podem ser superadas com o apoio da filantropia. Promover
arranjos inovadores de cooperação multistakeholder; investir em protótipos de
soluções alicerçadas na proteção ambiental; fomentar processos em rede e
aprimoramento de capacidades da sociedade civil e do Estado; apoiar o advocacy
da sociedade civil para o aprimoramento de políticas públicas como também a
produção de pesquisas e conhecimento junto a think tanks e
universidades e, ainda, catalisar mecanismos financeiros e capitais para um
mercado mais sustentável são práticas filantrópicas correntes.
Não
há dúvida que iniciativas e investimentos filantrópicos — se bem estruturados,
direcionados e conectados — produzem resultados de grande impacto em benefício
à sociedade. A filantropia tem, portanto, e especialmente nesta edição do G-20,
a chance de imprimir sua digital em um extraordinário legado de soluções
integradas para um planeta mais justo, equânime e verdadeiramente sustentável.
*Renata
Piazzon é diretora-geral do Instituto Arapyaú, cofacilitadora da Coalizão
Brasil Clima Florestas e Agricultura e representante do Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável (CDESS)
*
Cassio França é secretário-geral do GIFE — referência nacional em
fortalecimento da filantropia e organização brasileira líder do GT9
(”Filantropia e Desenvolvimento Sustentável”) do C20-G-20.
Estadão
Não deixe de curtir nossa
página Facebook e
também Instagram para
mais notícias do Blog do professor TM
AVISO: Os comentários são de responsabilidade dos autores e não representam a opinião do Blog do professor Taciano Medrado. Qualquer reclamação ou reparação é de inteira responsabilidade do comentador. É vetada a postagem de conteúdos que violem a lei e/ ou direitos de terceiros. Comentários postados que não respeitem os critérios serão excluídos sem prévio aviso.
Postar um comentário