(*) Daniel Navas
Quem
acompanha as notícias de economia já deve ter reparado que sempre que é falado
sobre a inflação, menciona-se a taxa de emprego e o salário médio do
brasileiro. Mas, afinal de contas, qual é a relação entre esses três elementos
(inflação, emprego, salário)? Um spoiler: uma dessas ligações envolve a
chamada Curva de Philips.
Vamos
explicar, em detalhes, sobre essa teoria logo abaixo. Mas antes, é importante
saber por que a inflação é tão importante para a economia e para o seu bolso.
Poder
de compra
Então,
basicamente, a inflação é um aumento contínuo e generalizado de níveis de
preço. “É um indicador social importante para a economia. Por isso, a primeira
coisa é que a inflação é nociva para a economia e para o poder de compra dos
consumidores. Já que a inflação afeta o quanto o dinheiro vale”, explica Rubens
Moura, professor de ciências econômicas da Faculdade Presbiteriana Mackenzie.
Portanto,
a taxa é tema importante para a economia porque, quando ela está elevada, pode
gerar incerteza no mercado e levar à redução dos níveis de investimento.
“Na
prática, a inflação faz com que o dinheiro do consumidor passe a valer menos. O
que significa que a mesma quantia possibilita a aquisição de uma quantidade
menor de bens e serviços. E isso reduz o poder de compra da população e pode
impactar negativamente o bem-estar econômico geral. Além disso, a alta inflação
pode levar a um ambiente econômico instável, dificultando o planejamento de
longo prazo para empresas e consumidores”, comenta Luciana Maia Campos Machado,
superintendente acadêmica e professora de finanças da FIPECAFI.
Além
disso, a inflação alta também afeta o custo da dívida pública. Isso porque os
agentes que compram os títulos do governo só continuarão comprando-os se esses
incluírem um prêmio que compense as incertezas associadas com a inflação mais
alta.
“Dessa
maneira, diante de um cenário de inflação crescente, o governo vê reduzida a
sua capacidade de se financiar via endividamento e se depara com maiores custos
da dívida. E isso prejudica o investimento em áreas relevantes para o
crescimento econômico, como saúde, educação e infraestrutura, por exemplo”,
afirma Alex Nery, professor da FIA Business School.
Aumento
dos preços ao longo dos anos
Fato
é que analisar a inflação acumulada nos oferece uma visão clara do impacto do
aumento de preços em um período mais extenso. O que revela como a inflação pode
corroer o valor do dinheiro ao longo dos anos.
“Isso
enfatiza a importância de proteger suas economias contra a inflação, pois
deixar de fazê-lo pode resultar em uma perda significativa de poder de compra.
Sem uma estratégia para compensar as perdas inflacionárias, o valor real de
suas economias diminui, comprometendo sua capacidade de adquirir bens e
serviços no futuro”, analisa Luciana.
No
gráfico abaixo, é possível ver a inflação dos últimos 10 anos, de abril de 2014
a abril de 2024. No período, a inflação acumulada foi de 81%. Isso mostra como
os preços aumentaram significativamente ao longo de uma década. Acompanhe:
Inflação
em baixa também é problema
Por
outro lado, quando a taxa está negativa, ou seja, em deflação, ela pode
prejudicar o funcionamento da economia. “Quem vende o produto poderá ter
prejuízo se os preços diminuírem, pois irá ganhar menos na venda de um estoque
já realizado quando os preços estavam mais altos”, diz o professor.
Então,
quem adquire o produto pode deixar de comprar hoje na esperança de que no
futuro o preço esteja menor. Com isso, investimento e consumo podem reduzir,
impactando negativamente o crescimento da economia.
“Portanto,
para uma economia saudável, o ideal é manter a inflação em um nível estável e
controlado, impedindo que os preços subam ou desçam de maneira imprevisível”,
conta Nery.
Curva
de Philips: taxa de emprego versus inflação
Como
você percebeu, então, essa relação do emprego com a inflação é um aspecto
importante da economia e começou a ser estudada já na década de 1920. Porém,
foi o economista A. W. Phillips que desenvolveu em 1958 um diagrama que
estabeleceu uma relação entre a inflação e a taxa de desemprego no Reino Unido,
ano a ano, no período compreendido entre 1861 e 1957.
“Com
base nesse trabalho, Phillips observou uma relação inversa entre inflação e
desemprego no curto prazo. Ou seja, quando o desemprego subia, a inflação
baixava, e vice-versa”. E foi assim que foi criada a chamada Curva de Philips.
Mas
por que isso ocorre? “Quando muitas pessoas estão empregadas, há mais dinheiro
circulando. Com mais dinheiro circulando, a demanda por bens e serviços
aumenta. Se a demanda aumenta mais rápido que a oferta, os preços tendem a
subir. O que resulta em inflação. Do outro lado, quando poucas pessoas estão
empregadas, menos dinheiro está sendo gasto. Com menor demanda por bens e
serviços, os preços tendem a crescer mais lentamente, o que reduz a inflação”,
explica Luciana.
Salário
versus inflação
Bem,
agora que você já sabe como funciona a Curva de Philips, vale entender que, de
certa forma, a relação do salário médio com a inflação é bem parecida com a
teoria mencionada. Então, em geral, o aumento do salário médio resulta no maior
poder de compra dos consumidores e, consequentemente, em aumento do consumo por
bens e serviços.
“E
aí, com uma maior demanda por seus produtos e os aumentos nos custos de
produção decorrentes dos salários mais altos, os empresários tendem a elevar os
preços das mercadorias. O que pressiona os índices de
inflação. Diante da elevação da taxa, o poder de compra dos salários diminui. E
para manter o padrão de vida, os trabalhadores podem exigir novos aumentos
salariais, num círculo que tende a retroalimentar o processo inflacionário”,
conta Alex Nery.
Para
se ter uma ideia, de acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA), atualmente o salário médio no Brasil é de R$ 3.118 por mês. Já
no último Boletim
Focus , a expectativa de inflação é de 3,80% ao ano.
“No
início do ano, com R$ 3.118, uma pessoa poderia comprar um certo conjunto de
bens e serviços. Mas, ao final do ano, para comprar o mesmo conjunto de bens e
serviços, essa pessoa precisaria de aproximadamente R$ 3.237,48. Então, se o
salário dessa pessoa não aumentar para pelo menos R$ 3.237,48, ela terá que
cortar gastos ou comprar menos, porque o poder de compra diminuiu devido ao
aumento dos preços causado pela inflação”, afirma Luciana Maia Campos Machado.
Informalidade
atrapalha relação salário e inflação
Por
outro lado, de acordo com Nery, a teoria estabelece essa relação para situações
nas quais a economia está em pleno emprego. Ou seja, quando o desemprego
efetivo se encontra na sua taxa natural.
“Mas
embora as taxas de desocupação no Brasil estejam se reduzindo ao longo dos
últimos anos, com a média móvel da taxa de desocupação em 7,75% da força de
trabalho em março de 2024 contra 8,49% de maio de 2023, não há consenso se a
economia brasileira está em pleno emprego. Além disso, o trabalho informal e
baixa produtividade do trabalho são fatores que prejudicam a aplicação mecânica
da relação entre salário/inflação para o caso brasileiro”, afirma.
Como
o investidor pode usar a Curva de Philips a seu favor?
A
relação entre emprego, salário e inflação mexe com a roda da economia. E pode
ainda influenciar os investimentos. Mas veja: de uma forma positiva. Ajudando a
planejar estratégias de investimento e reduzir o risco da carteira.
“Quando
a taxa de emprego é alta e a inflação está subindo, os investidores podem
ajustar suas carteiras para incluir ativos que se valorizam em ambientes
inflacionários. E aí estamos falando de ações de empresas com poder de
precificação e títulos de renda fixa atrelados à inflação, como o Tesouro IPCA+
no Brasil. Investir em imóveis também pode ser vantajoso, pois os preços dos
imóveis e os aluguéis tendem a subir com a inflação”, comenta Luciana.
Já
quando a inflação aumenta e os salários não acompanham, o poder de compra dos
consumidores diminui. E isso pode levar a uma queda na demanda por bens e
serviços. O que afeta negativamente as empresas que dependem do consumo
doméstico.
“Investidores
podem antecipar essa dinâmica e ajustar suas estratégias de investimento para
proteger o capital. Ações de empresas com poder de precificação, especialmente
nos setores de consumo básico, energia e saúde, tendem a ser boas escolhas”,
afirma a professora da FIPECAFI.
Além
disso, diversificar portfólios internacionalmente, investindo em
ativos denominados em moedas fortes como o dólar ou o euro, pode proteger contra
a inflação doméstica. “Embora mercados emergentes possam oferecer crescimento,
eles também trazem maior volatilidade
e risco inflacionário. Setores como tecnologia e saúde, que têm
demanda relativamente inelástica, podem oferecer proteção durante diferentes
ciclos econômicos. Investimentos em commodities como ouro e petróleo também
podem se beneficiar em períodos de alta inflação”, finaliza a especialista.
Então,
agora é com você, investidor e investidora. Fique atento à Curva de Philips e
às relações com a inflação e use tudo isso a seu favor.
(*) Editor-assistente da
Inteligência Financeira
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