O mundo inteiro sabe da admiração e do carinho que Lula e Maduro nutriam um pelo outro. Eles faziam questão de escancarar, mas como em toda relação seja pessoal, profissional e até mesmo na política existe uma linha tênue que a qualquer momento pode ser rompida.
O relacionamento entre o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente venezuelano Nicolás Maduro é um dos mais intrigantes da política latino-americana recente. Embora compartilhem posições políticas semelhantes e uma visão crítica em relação à influência dos Estados Unidos na região, o vínculo entre eles passou de uma admiração mútua a um cenário de tensões e até ofensas diplomáticas, revelando os limites das alianças entre líderes progressistas.
Nos anos 2000, Lula e Hugo Chávez, antecessor de Maduro, eram aliados próximos. Compartilhavam uma visão de integração regional e fortalecimento da América Latina contra o domínio das potências ocidentais. Com a morte de Chávez em 2013, Maduro assumiu a presidência da Venezuela, mas seu governo enfrentou uma série de crises econômicas, sociais e humanitárias que deterioraram a imagem do país na comunidade internacional. Lula, então ex-presidente do Brasil, continuou a defender a soberania venezuelana, mas evitou endossar totalmente a gestão de Maduro, especialmente em um contexto de crescente repressão interna e dificuldades econômicas severas na Venezuela.
Com o retorno de Lula à presidência em 2023, o relacionamento entre os dois líderes ganhou novos contornos. Em um dos primeiros encontros oficiais entre ambos, Lula buscou dar sinais de apoio diplomático a Maduro, afirmando que "há uma narrativa muito negativa sobre a Venezuela" e defendendo uma visão menos polarizada do que ocorria no país. Isso foi visto como um gesto de solidariedade, especialmente no contexto de isolamento internacional enfrentado pelo governo venezuelano. Contudo, a pressão sobre Lula para tomar uma posição mais clara em relação ao governo de Maduro cresceu, tanto por parte da opinião pública interna como de líderes internacionais, que questionavam os limites de sua diplomacia.
Nos meses que se seguiram, a aproximação começou a revelar suas fricções. Em eventos multilaterais e entrevistas à imprensa, Lula passou a mencionar que a situação da Venezuela demandava atenção aos direitos humanos e ao estado de direito. Em resposta, Maduro, num tom mais incisivo, acusou os críticos de “interferência” e destacou que seu governo "não precisava de conselhos". A relação cordial deu lugar a um jogo de declarações ambíguas, onde as críticas veladas começaram a substituir o tom amigável que marcava as interações entre os dois. Esse desgaste foi agravado por pressões internas que Lula enfrenta.
Nesta sexta-feira (1º), mais um episódio envolvendo os dois mandatários teve "tom ofensivo" adotado pela Venezuela em relação ao Brasil, segundo o governo brasileiro, em meio à crise provocada pelo veto brasileiro à entrada de Caracas no Brics e os questionamentos sobre a reeleição de Nicolás Maduro.
"O governo brasileiro constata com surpresa o tom ofensivo adotado por manifestações de autoridades venezuelanas em relação ao Brasil e aos seus símbolos nacionais", disse o Itamaraty em um comunicado.
Seguindo o jornal AFP, as relações com o país vizinho se deterioraram após a exigência de Brasília de não reconhecer os resultados eleitorais venezuelanos enquanto não forem publicadas as atas da votação de 28 de julho.
A oposição venezuelana reivindica a vitória de seu candidato, Edmundo González Urrutia, e denuncia fraude.
A crise se intensificou com o veto brasileiro ao ingresso da Venezuela ao Brics, decidido na semana passada durante a cúpula do bloco em Kazan, na Rússia.
O governo venezuelano convocou seu embaixador em Brasília para consultas e chamou o encarregado de negócios do Brasil em Caracas.
Antes, Maduro acusou o Itamaraty de "conspirar contra a Venezuela", evitando responsabilizar diretamente Lula pelo veto.
Em sinal de aumento das tensões, a Polícia Nacional da Venezuela (PNB) publicou na quinta-feira, no Instagram, uma imagem com uma silhueta sombria semelhante à de Lula e uma bandeira brasileira com a legenda: "Quem se mete com a Venezuela se dá mal".
A PNB está sob o comando do ministro do Interior, Diosdado Cabello, do setor mais radical do chavismo.
"A opção por ataques pessoais e escaladas retóricas, em substituição aos canais políticos e diplomáticos, não corresponde à forma respeitosa com que o governo brasileiro trata a Venezuela e o seu povo", afirma a nota da chancelaria brasileira.
"Não vamos entrar no jogo de desqualificações", insistiu à AFP um alto funcionário do Itamaraty, sob anonimato.
As críticas se concentraram no ex-chanceler Celso Amorim, assessor de Lula, a quem o ministério de Relações Exteriores venezuelano chamou de "mensageiro do imperialismo norte-americano", que "se dedicou de maneira impertinente a emitir juízos de valor sobre processos que só dizem respeito aos venezuelanos".
Amorim foi observador nas eleições presidenciais e disse que Maduro lhe prometeu divulgar a contagem detalhada dos votos, mas isso ainda não ocorreu.
Segundo Amorim, a decisão no Brics foi tomada porque "houve uma quebra de confiança" em relação à Venezuela após as eleições no país vizinho.
(*) Professor e analista político
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