A vaca dos Correios: só couro e osso, mas ainda ordenham até o último centavo

 

Foto ilustrativa

(*) Taciano Medrado

Enquanto os trabalhadores dos Correios enfrentam anos de sucateamento, precarização e desvalorização, a empresa parece ter virado uma espécie de “vaca magra” que ainda é ordenhada até secar. A expressão popular "só o couro e o osso" define bem a situação: o essencial já foi levado, mas o pouco que resta ainda é alvo de interesse — e, pasmem, até para fins que beiram o absurdo.

Recentemente, a discussão voltou à tona com denúncias e críticas sobre o uso de recursos da empresa pública para patrocinar eventos culturais e artistas — enquanto carteiros enfrentam jornadas exaustivas, estrutura deficiente e salários defasados. A incoerência salta aos olhos: como pode uma empresa alegadamente em crise, com ameaça constante de privatização, bancar projetos culturais milionários?

Se não bastasse a grave crise financeira e denúncias de atrasos no repasse ao FGTS, os Correios decidiram investir R$ 4 milhões como patrocinador master da nova turnê do cantor Gilberto Gil.

O patrocínio gerou forte indignação entre servidores da estatal, que alegam abandono por parte da gestão enquanto enfrentam a suspensão de atendimentos médicos e ameaça de greve.

Os shows tiveram início no fim de março, período em que a estatal já havia anunciado prejuízos de R$ 2,2 bilhões em 2025. Além disso, transportadores terceirizados estariam sem pagamento, e diversos hospitais descredenciaram o plano de saúde dos trabalhadores, conhecido como Postal Saúde, por falta de repasses.

Não se trata de desmerecer a arte, muito menos a cultura. Mas é necessário ter critério, transparência e prioridades. Quando a sobrevivência básica da instituição está em risco, cada centavo deveria ser revertido para sua reestruturação e para valorização de quem move a engrenagem — os trabalhadores. Em vez disso, vemos recursos sendo canalizados para eventos que, em muitos casos, nem guardam relação direta com os objetivos da empresa.

Essa política escancara uma velha prática: sugar o que puder das estatais até que não reste mais nada, para então justificar sua entrega ao setor privado como solução inevitável. A retórica é sempre a mesma — a empresa dá prejuízo, não é eficiente, o serviço está ruim. Mas ninguém diz que a má gestão, o desvio de foco e o desmonte foram orquestrados ao longo do tempo.

E quando alguém questiona, vem aquela resposta padrão: “investimento em cultura é importante”. Ah, claro! Mas e investir em dignidade pros funcionários, não é? E em estrutura decente pra atender a população, não seria também essencial? Porque, veja bem, quando é pra reformar agência, contratar mais pessoal ou melhorar o serviço, o discurso é que “não tem verba”. Mas pra financiar festival com nome bonito e tapete vermelho, aparece dinheiro como mágica.

No fim, é o mesmo roteiro de sempre: destroem por dentro, desmoralizam por fora, e depois jogam a culpa nos próprios trabalhadores pra justificar a privatização. É uma novela repetida — só muda o nome da estatal. E quem sempre sai perdendo? O povo.

A verdade é dura, mas precisa ser dita: os Correios viraram um barril de leite seco onde meia dúzia ainda tenta fazer queijo gourmet. Só que dessa vez, não dá mais. A vaca tá magra demais, e se continuar assim, nem os ossos vão sobrar.

A “vaca dos Correios” está esgotada. Só restam couro e osso. E mesmo assim, em vez de cuidados para sua recuperação, o que se vê é mais uma tentativa de tirar proveito, nem que seja à custa de sua total destruição. Cabe a nós perguntar: até quando?

(*) Professor e analista político

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